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Ciclovias no rumo certo

O que essa lei fez foi apenas estabelecer normas que a rigor nem deveriam precisar dela, porque fazem parte das obrigações comezinhas de qualquer administrador responsável

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Por Redação
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Concretizaram-se apenas parcialmente, até agora, as esperanças de que a mudança de governo levaria à correção dos graves erros cometidos pelo ex-prefeito Fernando Haddad na implantação, improvisada e às carreiras, de uma rede de ciclovias e ciclofaixas de mais de 400 km. Com a sanção, em novembro de 2017, da Lei 16.738, que prevê novas e acertadas regras para a expansão da rede, preserva-se o futuro – o que é um inegável e importante avanço –, mas não se toca na pesada herança deixada pelo governo petista, que contém distorções inaceitáveis, porque afetam negativamente o sistema viário.

O que essa lei fez foi apenas estabelecer normas que a rigor nem deveriam precisar dela, porque fazem parte das obrigações comezinhas de qualquer administrador responsável. Tais como estudos de demanda que justifiquem a implantação de uma ciclovia, demonstrem sua viabilidade técnica e meçam seu impacto no sistema viário, antes de submeter o projeto a audiências públicas. Nada disso foi feito pelo governo do ex-prefeito Haddad, que nunca divulgou estudos técnicos, de seriedade inquestionável, sobre as ciclovias que se sucederam em ritmo acelerado durante seu mandato.

A única coisa não improvisada, mas pensada friamente com claro objetivo demagógico, foi a escolha da maior parte dos locais de implantação das ciclovias. Não a periferia onde elas são mais necessárias e por isso deveria ter prioridade, mas pontos escolhidos a dedo do centro expandido, como a Avenida Paulista, a Rua da Consolação e bairros de Santa Cecília e Higienópolis, para citar apenas alguns exemplos. Em vez de pensar na periferia, como era de esperar de quem, como todo petista, se apresentava como campeão do “social”, Haddad preferiu o brilhareco de bairros de classe média.

Não admira que boa parte das ciclovias, feitas para inglês ver, não tenha real utilidade, nem para ida e volta de trabalho e escola, nem mesmo para lazer. Continua até hoje entregue às moscas, com perda de espaço que poderia ter melhor utilidade. Mal planejadas e feitas às presas, existem também as que não oferecem segurança aos ciclistas e por isso são igualmente pouco usadas.

É do interesse da cidade que a Prefeitura pense seriamente na correção desse erro do passado. É preciso eliminar corajosamente as ciclovias cuja inutilidade é fácil demonstrar. Os próprios ciclistas, por meio de suas associações, só teriam a ganhar apoiando uma medida como essa. Eles devem ser os primeiros interessados em evitar que a irresponsabilidade do ex-prefeito comprometa uma iniciativa como a das ciclovias, que produziu e continua produzindo bons resultados em grandes cidades de todo o mundo onde foram implantadas e são regularmente expandidas com base em planejamento rigoroso.

Se a Prefeitura estiver mesmo interessada em recuperar o projeto das ciclovias, livrando-o dos desvarios demagógicos de Haddad, deve levar em conta, ainda, dois itens fundamentais. O primeiro é a necessidade de eleger a periferia como prioridade para a implantação de ciclovias. Basta usar como parâmetro, como estabelece a Lei 16.738, os estudos de demanda. Nessa região da cidade é sabidamente mais intenso o uso da bicicleta como meio de transporte para o trabalho e a escola. Pesquisa sobre mobilidade feita pelo Metrô indica que nos vários bairros da periferia são realizadas, em média, cerca de 18 mil viagens a trabalho, por dia, com bicicleta.

O segundo item, também previsto nessa lei – quando ela fixa como diretriz a “promoção contínua de esforços para a convivência segura entre ciclistas, pedestres e modais de transporte motorizado” –, é a fixação dos deveres dos ciclistas, boa parte dos quais até agora pensa ter apenas direitos. Para isso é preciso encontrar uma forma de punir os que desrespeitam leis de trânsito, furam sinais, andam fora das ciclovias onde elas existem, na contramão, com agressividade e imprudência nas calçadas e sem dispositivos de segurança como faroletes.

Medidas como essas são essenciais para assegurar o êxito das ciclovias.