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Opinião|Código Florestal - novas perspectivas

Atualização:

O novo Código Florestal, aprovado em 2012, leva adiante o compromisso da sociedade brasileira de proteger fração substantiva de vegetação nativa nas propriedades rurais. Esse compromisso tem implicações importantes não só para o meio ambiente, mas, sobretudo, para avançarmos no desenvolvimento econômico das áreas rurais e no acesso a mercados internacionais. Esse avanço passa, necessariamente, pelo sucesso da aplicação da sustentabilidade em duas frentes. A primeira diz respeito à inovação na gestão e na diferenciação dos produtos brasileiros. A segunda se refere a conquistas de mercados mais estratégicos e produtos made in Brazil a preços competitivos.

Um dos grandes desafios do Brasil, hoje protagonista em produção e exportação de matérias-primas, é deixar de ser coadjuvante em produtos de maior valor agregado. A implantação do Código Florestal pode ajudar a quebrar esse paradigma, à medida que criarmos um projeto de diferenciação do produto nacional e estabelecermos uma produção puxada por aqueles consumidores internacionais que têm a predisposição de pagar mais caro pelo produto que já traz embutido o componente ligado à gestão efetiva dos ativos ambientais. Só o Brasil, por ser uma potência ambiental e agropecuária, pode oferecer isso.

A agricultura no Brasil tem passado por transformações estruturais, como ocorre em outros países líderes na produção de alimentos. Uma das mudanças significativas tem sido a substituição de sistemas de produção intensivos em recursos naturais por estruturas baseadas em tecnologia, informação, capital e recursos humanos. O processo ocorre em vários setores do agronegócio brasileiro, em maior ou menor grau, dependendo das circunstâncias específicas. Mas ainda estamos longe de atingir todo o potencial produtivo das áreas já disponíveis. São grandes as oportunidades para conciliarmos crescimento da produção de alimentos e proteção dos ativos ambientais.

Em linhas gerais, o novo Código Florestal determina que cada propriedade rural do País estabeleça parte do território como reserva legal, com porcentuais de 20% a 80%, além de áreas de preservação permanente como cursos de rios, nascentes e encostas. Dessa forma, o código pode atuar como um catalisador deste processo de modernização. Ao estabelecer o melhor controle das restrições sobre a expansão da área utilizada em propriedades rurais, a nova legislação privilegia o avanço da produtividade, ao incentivar aumentos de produção de forma compatível com o meio ambiente, especialmente no que se refere à proteção dos recursos hídricos e das florestas nativas.

Um elemento importante no processo de implantação do novo código é o Cadastro Ambiental Rural (CAR), que é o registro eletrônico obrigatório para todos os imóveis rurais, criado com a finalidade de compor uma base de dados para o cumprimento da nova legislação ambiental e também para as demais políticas. O CAR permite a implementação de novos instrumentos de monitoramento e de combate ao desmatamento, inclusive por controle remoto, por propriedade, dos remanescentes de vegetação nativa. Além disso, o País poderá planejar o desenvolvimento do agronegócio e novas políticas públicas, direcionando recursos e esforços para áreas estratégicas.

No âmbito internacional, o potencial também é enorme. De um lado, as tendências demográficas mundiais apontam para o necessário aumento substantivo da produção de alimentos. De outro, sabe-se que as projeções climáticas sugerem a necessidade de reduzir de forma expressiva as trajetórias de emissão de gases de efeito estufa, a fim de abrandar as mudanças no clima e os impactos danosos ao crescimento econômico, além dos riscos para a população. São desafios que sugerem às negociações internacionais incorporar a necessidade de compatibilizar a melhor oferta de produtos agropecuários com a mitigação das emissões de carbono.

Diante dessa necessidade de equilíbrio entre produção e conservação, o Brasil está numa posição singular, ao oferecer caminhos viáveis de contribuição para ambos os objetivos. O País tem ativos ambientais em escala relevante, principalmente florestas, e uma vasta disponibilidade de terras suscetíveis à produção de alimentos.

Como o comércio internacional interfere neste processo? A implantação do Código Florestal é uma garantia de que a produção de alimentos no Brasil será feita de forma consistente com a proteção dos recursos naturais, operando como uma espécie de certificado de qualidade. Isso cria um círculo virtuoso. O custo de manutenção do Código Florestal - e, consequentemente, a proteção dos remanescentes florestais - está associado à capacidade de expansão da produção via ganhos de produtividade, o que requer mais investimento em relação ao aplicado na agricultura tradicional.

O acesso a novos mercados internacionais, neste contexto, é fonte de receita para os produtores, viabilizando os investimentos em escala relevante. Ao mesmo tempo que o Código Florestal contribui para abrir mercados, as receitas de exportação facilitam a implantação das novas regras ambientais. Este é um modo muito promissor para o Brasil associar as negociações sobre o clima com as negociações comerciais de seu interesse. Afinal, na contramão do argumento acima, barreiras comerciais a produtos brasileiros gerariam efeitos análogos à taxação aos esforços do País na preservação de seus remanescentes florestais.

Nesse sentido, as políticas comerciais e o Código Florestal tornam-se elementos complementares do processo de transformação da agricultura do País. O Brasil poderá oferecer aos países com maiores pressões demográficas e menor aptidão agrícola o suprimento de suas necessidades sem riscos à proteção dos recursos naturais em escala global. É um movimento que parece ser capaz de gerar volume relevante de divisas para o desenvolvimento do País, além da proteção de nossos ativos naturais.

GUSTAVO DINIZ JUNQUEIRA E JULIANO ASSUNÇÃO SÃO, RESPECTIVAMENTE, PRESIDENTE DA SOCIEDADE RURAL BRASILEIRA (SRB) E SÓCIO-DIRETOR DA BRASILPAR; E PROFESSOR DE ECONOMIA DA PUC-RIO E DIRETOR DO CLIMATE POLICY INITIATIVE

Opinião por Gustavo Diniz Junqueira
Juliano Assunção