
08 de julho de 2016 | 03h00
De toda forma, foi com imenso alívio que o País recebeu essa notícia. Se é certo que o afastamento da presidência da Câmara e de seu mandato, determinado no início de maio pelo Supremo Tribunal Federal (STF), trazia dificuldades para que o deputado continuasse usando as prerrogativas do cargo para atrapalhar o julgamento de seu caso no Conselho de Ética, também é certo que a excepcional decisão da Suprema Corte não excluía o grave dano institucional e moral advindo do fato de uma pessoa com o histórico de Cunha ter sido colocada naquela posição – mesmo que tenha sido temporariamente afastada dela.
Ao apresentar sua renúncia, o deputado Eduardo Cunha afirmou ser vítima de perseguições e que seus algozes não respeitaram a sua família. Tudo indica o oposto. As denúncias apontam que foi ele quem não respeitou sua família, envolvendo-a em seus escândalos. Uma de suas filhas é investigada pela Operação Lava Jato. Recentemente, sua mulher, Cláudia Cruz, tornou-se ré em ação conduzida pelo juiz Sergio Moro e responde a processo por lavagem de mais de US$ 1 milhão.
Além de ser acusado de manter contas não declaradas na Suíça e de ter mentido na CPI da Petrobrás sobre a existência delas – acusações que fundamentam o processo de cassação de seu mandato por quebra de decoro parlamentar –, Cunha responde por duas ações penais: uma derivada de denúncia da Procuradoria-Geral da República (PGR), que o acusa de receber propina em contas na Suíça, e outra de receber propina por contrato de produção de navios-sonda para a Petrobrás. Segundo a PGR, Cunha recebeu R$ 52 milhões em propinas na obra de um porto no Rio e ainda intimidou testemunhas na CPI da Petrobrás. Recentemente, a Lava Jato protocolou ação civil pública de improbidade contra Cunha, acusado de se beneficiar do esquema na Petrobrás. Os procuradores querem que ele pague uma multa de R$ 270 milhões.
Mas não são apenas as denúncias envolvendo Eduardo Cunha que causam escândalo. É também constrangedor o apoio que, mesmo agora, ele consegue amealhar na Câmara. Basta ver o parecer do deputado Ronaldo Fonseca (PROS-DF), apresentado anteontem na Comissão de Constituição e Justiça, recomendando a anulação da votação no Conselho de Ética do processo de cassação de Cunha. Segundo Fonseca, a votação não poderia ter sido nominal, com chamada no microfone dos conselheiros, pois tal sistema teria prejudicado Eduardo Cunha, ao provocar o “efeito manada” de votos favoráveis à sua cassação. Segundo o ilustre relator, o procedimento correto deveria ser a votação no painel eletrônico.
É por esse tipo de manobra que o processo de cassação de Cunha já é recordista em tempo de duração, com mais de 240 dias. A determinação e a capacidade – sua e de seus aliados – de se comportar dessa maneira ajudam a compreender aquilo que parece incompreensível: como alguém com o currículo de Cunha chega onde chegou e lá permanece por tanto tempo.
A exemplo da presidente Dilma Rousseff, que diz que seu processo de impeachment é fruto do desejo de vingança de Cunha, ele agora diz que está “pagando um alto preço por ter aberto o impeachment da presidente afastada Dilma Rousseff”. Nenhum dos dois está com a verdade. Essas duas tristes figuras são fruto, direto ou indireto, do lulopetismo, no qual a política é mero caminho para interesses privados – pessoais, partidários ou ideológicos.
A renúncia de Eduardo Cunha à presidência da Câmara representou um passo rumo à moralidade pública. Agora, é preciso dar continuidade ao processo de cassação de seu mandato, bem como às investigações e ações penais. Não pode ficar impune tamanho insulto à lei, à democracia e aos bons costumes.
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