Imagem ex-librisOpinião do Estadão

Comida liberada nas ruas

Exclusivo para assinantes
Por Redação
2 min de leitura

As ruas de São Paulo ganharão os chamados food trucks, vans adaptadas para comercialização de refeições, comuns em cidades do exterior, como Nova York. O prefeito Fernando Haddad sancionou lei que permite a venda de alimentos em veículos automotores, carrinhos, tabuleiros ou em barracas desmontáveis, desde que não ultrapassem o tamanho máximo de 6,3 metros e que sejam recolhidos no fim do expediente. A comercialização não poderá ainda atrapalhar o já complicado trânsito da capital e a circulação de pedestres. De acordo com a Prefeitura, pretende-se com isso fomentar o empreendedorismo e formalizar o comércio de alimentos na cidade. A iniciativa é oportuna, considerando-se que São Paulo figura entre os mais diversificados centros gastronômicos do mundo - as cozinhas de mais de 50 nações estão representadas na capital - e que renomados chefs estão interessados em levar para as ruas versões mais acessíveis e rápidas de seus pratos. Bem aplicada, a lei pode permitir que a cidade, que hoje reúne 15 mil restaurantes, ganhe novos empreendedores no chamado segmento de alimentação fora do lar. Conforme dados da Pesquisa de Orçamentos Familiares do IBGE, esse setor movimenta R$ 31 bilhões por ano no Estado de São Paulo, grande parcela desse total na capital.É essencial, no entanto, que o decreto que regulamentará o funcionamento da venda de comida de rua em São Paulo, assim como a emissão dos documentos de autorização, considere detalhadamente todos os itens essenciais à garantia da segurança de quem consome alimentos na rua, a capacitação de quem comercializa os alimentos, a segurança dos equipamentos que serão instalados na rua, a fiscalização e a ocupação do espaço público sem prejuízos para a população. Os food trucks são veículos grandes que precisam de amplas vagas de estacionamento, o que exige planejamento detalhado numa cidade onde a carência de vagas é grande e o trânsito, um dos piores do mundo. Pesquisas recentes mostram que mais de 65% da população brasileira come fora de casa e, desse total, a metade pertence à classe C. Portanto, não há de se acreditar que a nova lei só levará às ruas um comércio de alimentação com o glamour dos grandes chefs. A maior parte da população seguirá a lista de preços e escolherá as opções mais baratas. Assegurar a qualidade dos alimentos, a higiene e o serviço adequado é o grande desafio que a Prefeitura se impõe ao liberar a venda de comida nas ruas. O governo municipal terá ainda de equilibrar os interesses de grandes investidores, dispostos a explorar esse rico filão, e de ambulantes muito mais modestos. Food trucks são investimentos para quem está disposto a desembolsar até R$ 250 mil. Portanto, se a intenção da Prefeitura é regulamentar, democratizar e qualificar o setor, terá de atentar para o fato de que grande parte dos futuros empreendedores trabalhará com barracas e tabuleiros, e bem menor investimento. A determinação do número de ambulantes permitido nas calçadas será essencial para garantir que a comida nas ruas seja fator de atração e de enriquecimento do convívio e não mais um obstáculo ao uso do espaço público pela população. As calçadas de São Paulo são mal dimensionadas, seu mobiliário urbano é mal planejado, e elas são mal mantidas. Se vão abrigar carrinhos, barracas e tabuleiros, deveriam ter condições para tal.Os interessados em comercializar comida nas ruas da capital terão de solicitar um Termo de Permissão de Uso, que será emitido pela subprefeitura da área pleiteada. O documento terá a validade de um ano e poderá ser renovado por mais um mediante a cobrança da taxa de ocupação da área, cujo valor será definido com base na Planta Genérica de Valores.Está aí mais um motivo para que a Prefeitura fortaleça a fiscalização: até hoje, ambulantes tomaram o espaço público sem nenhum tipo de despesa. Com a cobrança, ou se tornarão clandestinos ou o espaço público será apenas daqueles que têm condições de pagar por ele e a tão aclamada democratização não ocorrerá.