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Continua a guerra fiscal

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Por Redação
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Tornar pior o sistema tributário brasileiro pode parecer impossível, mas governadores de vários Estados têm conseguido esse prodígio, por meio da guerra fiscal, fonte de enormes distorções e, ultimamente, importante fator de risco para a indústria nacional e para a geração de empregos. Essa guerra se intensificou desde junho do ano passado, quando o Supremo Tribunal Federal (STF) declarou inconstitucionais 23 tipos de incentivos baseados na redução do Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS), o principal tributo recolhido pelos Tesouros estaduais. O Judiciário poderia eliminar o problema, se fizesse valer uma regra estabelecida na década de 1970: governos só podem conceder incentivos aprovados pelo Conselho Nacional de Política Fazendária (Confaz), formado por secretários de Fazenda de todo o País. Mas essa regra tem sido violada há várias décadas, os conflitos têm-se multiplicado e, apesar de muitas ações judiciais, a desordem persistiu.Apesar disso, a condenação daquelas 23 formas de incentivos parece ter sido tomada como um mau presságio por vários governadores. Enquanto a farra é possível, tentam aproveitar o tempo e multiplicar os benefícios ilegais, como se fosse possível atrair investimentos e promover o desenvolvimento de seus Estados sem recorrer a ilegalidades. Além disso, demoram a cumprir a determinação do STF de cobrar os impostos devidos pelas empresas beneficiadas irregularmente nos cinco anos anteriores. Alguns governadores defendem a convalidação dos incentivos já concedidos e uma longa transição para o novo regime - isto é, para o regime legal vigente há mais de quatro décadas. Mas a eliminação da guerra fiscal é mais urgente do que nunca, porque a farra dos incentivos hoje ameaça a sobrevivência de empresas brasileiras e o emprego de muitos milhares de trabalhadores. O conflito gerado pelos benefícios ilegais foi nos primeiros tempos um fator de distorção econômica, afetando as decisões de investimento das empresas. Hoje, mais que um fator de distorção, essa disputa é uma aberração econômica, porque beneficia o produtor estrangeiro em prejuízo do nacional. Nos primeiros tempos, a guerra dos incentivos produziu pelo menos alguns benefícios importantes para algumas regiões e favoreceu a modernização de alguns segmentos da indústria. Empresas puderam aproveitar os incentivos para construir instalações modernas, renovar seus equipamentos e ganhar eficiência. Ganharam produtividade e contribuíram para o desenvolvimento de algumas áreas em regiões menos industrializadas. Mas o prolongamento da guerra esgotou a possibilidade de mais benefícios, pelo acirramento da disputa entre Estados e pelo aumento do custo fiscal dos investimentos e da criação de postos de trabalho. As empresas passaram a promover leilões, cobrando vantagens cada vez maiores para investir e evidenciando cada vez mais a irracionalidade fundamental daquela política. Nos últimos dez anos a irracionalidade atingiu níveis sem precedentes, com a multiplicação de Estados envolvidos num novo tipo de ação predatória: a concessão de vantagens fiscais para a importação de produtos fabricados no exterior. Esses incentivos atraíram empresas importadoras. O ganho tributário proporcionado por essas operações foi obtido graças à imposição de uma concorrência absurda às indústrias instaladas no Brasil. Passou-se a estimular a produção estrangeira e a exportar empregos, como se isso fosse uma política de desenvolvimento. O Congresso poderá eliminar essa aberração, se aprovar um amplo corte da alíquota cobrada nas transações interestaduais com produtos importados. Isso reduzirá o crédito fiscal obtido no Estado por onde entrou o produto estrangeiro e restabelecerá as condições de competição. Para abandonar a guerra fiscal, governadores cobram das autoridades federais uma política de desenvolvimento regional - presumivelmente, mais dinheiro. A mera transferência de verbas pode ser muito boa para alguns grupos, mas nunca foi garantia de desenvolvimento. Se quiser criar uma política para as regiões, o governo federal terá de buscar algo mais sério.