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Crise política e risco-país

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Por Redação
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A crise política, um dos maiores entraves à arrumação das contas públicas, poderá levar mais uma agência a rebaixar o crédito do Brasil para o grau especulativo, tornando ainda mais difícil o acesso ao mercado financeiro internacional. Um dia depois de o ministro da Fazenda, Joaquim Levy, alertar os congressistas para a importância de se evitar esse risco, a Fitch, uma das três principais agências de classificação, anunciou um novo corte da nota brasileira – ainda mantida no grau de investimento, mas no patamar mais baixo e com perspectiva negativa. Mais uma redução poderá ocorrer se a situação política levar a dívida pública a uma condição pior que a esperada neste momento, avisou o diretor executivo da Fitch no Brasil, Rafael Guedes. No mês passado, a Standard & Poor’s (S&P) levou a nota de crédito soberano ao grau especulativo, reservado aos devedores menos confiáveis. Se o País for levado a essa classificação por uma segunda agência, provavelmente a Fitch ou a Moody’s, grandes fundos estrangeiros ficarão proibidos de investir em papéis emitidos pelo governo do Brasil. Além disso, o rebaixamento dos papéis soberanos contaminará, como já tem ocorrido, o crédito de empresas, tanto estatais quanto privadas. A revisão poderá atingir mesmo indústrias e bancos em boa condição financeira e com reputação favorável. Os danos podem ir muito além daqueles associados diretamente à imagem do Tesouro e de outros entes governamentais. A Fitch anunciou a revisão da nota brasileira por seus canais normais de comunicação, enquanto seu diretor Rafael Guedes participava, em São Paulo, do seminário Brasil 2016, organizado pela Câmara Americana de Comércio. A presença de um representante de agência de classificação num encontro desse tipo é mais que uma casualidade, neste momento. Novos cortes da nota brasileira são riscos evidentes para a economia nacional, no próximo ano, mas boa parte dos políticos, e até de membros do governo, parece dar pouca ou nenhuma importância a esse dado. “Não ter grau de investimento é botar emprego em risco e ninguém quer isso, havia dito o ministro da Fazenda, na quarta-feira, em pronunciamento no Congresso. A preocupação central dos avaliadores de risco é a evolução da dívida pública. O governo continua sem poupar sequer o suficiente para pagar os juros, lembrou o ministro. Como resultado, a dívida tende a crescer e a atingir um peso em geral desconhecido nas economias emergentes. Segundo a Fitch, a dívida bruta do setor público deveria chegar a 66% do Produto Interno Bruto (PIB) neste ano, a 69,5% em 2016 e a 71% em 2017. Alguns analistas, lembrou Guedes, projetam uma proporção de 80% em 2018, o dobro da estimada para países com a mesma classificação. No comunicado, a Fitch mencionou dois eventos negativos na visão dos classificadores – a redução das metas fiscais deste ano e do próximo, em julho, e o envio ao Congresso, em agosto, de uma proposta de Orçamento com déficit primário de R$ 32 bilhões. Os mesmos fatos foram mencionados pela S&P. Mas os motivos de preocupação dos analistas já eram e continuam sendo mais amplos e um dos mais importantes é o impasse criado pela resistência política às medidas de ajuste das contas públicas. Tudo isso torna mais difícil o retorno ao crescimento. A Fitch estima para este ano uma contração econômica de 3%, seguida de um recuo de 1% em 2016 (as mesmas projeções do Fundo Monetário Internacional). Com os negócios em baixa, a receita de impostos continuará insuficiente para cobrir as despesas do setor público. O ministro da Fazenda voltou a defender no Congresso a recriação do imposto do cheque, a Contribuição Provisória sobre Movimentação Financeira (CPMF). Ressuscitado, esse tributo poderá ajudar a fechar as contas. Mas há uma enorme diferença entre uma efetiva correção das contas – e, portanto, da gestão fiscal – e um acerto de ocasião, especialmente baseado num tributo tão ruim quanto a CPMF.