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Custeio, auxílios e patrocínios

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Por Redação
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Quando a ministra Eliana Calmon encerrou seu mandato no Conselho Nacional de Justiça (CNJ), em setembro de 2012, houve quem temesse pela perda de rigor do órgão na fiscalização e controle administrativo do Poder Judiciário. A decisão que o CNJ acaba de tomar depois de acirradas discussões, fixando um limite para o patrocínio de eventos da magistratura, mostra que esse temor era fundamentado. O tema ganhou destaque em dezembro, quando a Associação Paulista de Magistrados, na festa de confraternização do Natal, sorteou brindes - viagens e um automóvel - ofertados por empresas públicas e privadas. Antes de deixar o CNJ, onde por dois anos foi corregedora, a ministra Eliana Calmon apresentou uma proposta para regulamentar a participação de integrantes do Judiciário em eventos patrocinados - como congressos, encontros acadêmicos, homenagens, confraternizações e competições esportivas. A proposta de Calmon proibia os juízes de usar transporte ou hospedagem pagos ou subsidiados - mesmo que indiretamente - por pessoas físicas e por empresas. Obrigava os tribunais a controlar com rigor as atividades extrajurisdicionais de seus membros. Determinava que o conteúdo, carga horária, custos dos eventos e a origem do dinheiro que os custeariam deveriam ser "expostos de forma prévia e transparente". E só admitia exceções no caso de eventos promovidos por instituições de ensino onde o magistrado fosse professor ou em atividade educacional, em que atuasse como palestrante. Além de reafirmar os princípios constitucionais da impessoalidade, moralidade e publicidade, a proposta tinha por objetivo coibir abusos, como viagens internacionais de juízes financiadas por empresas, seminários realizados em resorts luxuosos pagos por bancos e torneios esportivos realizados em praias turísticas custeados por estatais. Na exposição de motivos, Eliana Calmon disse que os juízes têm de manter "conduta irrepreensível" e que não podem receber favores e auxílios de pessoas físicas e jurídicas que são parte em ações por eles julgadas. Ao assumir a Corregedoria Nacional de Justiça, em setembro de 2012, o ministro Francisco Falcão endossou essa proposta. Quando o plenário do CNJ se reuniu para discuti-la, a proposta recebeu, de saída, 6 votos favoráveis num colégio de 15 membros. Mas o julgamento foi suspenso por um pedido de vista e, quando a votação foi retomada, o CNJ surpreendeu ao aprovar uma proposta mais branda do que a de Eliana Calmon, apresentada pelo presidente do CNJ, ministro Joaquim Barbosa. Ao se opor à proposta de Eliana Calmon, em 2012, os juízes alegaram que, como suas entidades de classe são associações privadas, elas não poderiam ser fiscalizadas pela Corregedoria Nacional de Justiça ou sofrer sanções administrativas do CNJ. Para Eliana Calmon, o patrocínio do lazer da magistratura não era um problema jurídico, mas ético e moral. Na reunião de quarta-feira passada, o ministro Francisco Falcão reconheceu que a maioria dos eventos da magistratura não tem qualquer "efeito cultural", mas recuou, deixando de apoiar a proposta de Eliana Calmon e aceitou a fixação de um teto para o patrocínio de eventos de juízes. Com isso, em vez de vedar completamente o patrocínio, a resolução do CNJ autoriza entidades de juízes a receber até 30% do que será gasto em seminários e congressos. "Foi uma forma de viabilizar a aprovação da resolução. A proibição total, imediata, brutal, acabaria com todos os eventos atualmente existentes. Minha posição é de vedação total, pois resorts não combinam com trabalho intelectual sério. Mas isso virá no futuro", disse Barbosa, com apoio de Falcão. O CNJ, em sua configuração atual, parece ser mais vulnerável a pressões corporativas do que no passado. Ao término da reunião, as entidades da magistratura anunciaram que poderão questionar o teto no STF e, alegando que "a vida associativa não pode sofrer intervenções", afirmaram que não aceitarão a proibição total de patrocínios pelo CNJ.