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Da politicalha à regulação

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Por Redação
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O baixo poder de competição da economia brasileira, uma das menos integradas no mercado global, tem forte relação com a insegurança do investidor e as dificuldades do empresário para se mover no meio de regras confusas e instáveis. Citado em toda grande pesquisa internacional de competitividade, o problema é parte do dia a dia tanto do executivo quanto do cidadão meramente empenhado em ganhar a vida, cumprir as obrigações legais e escapar das armadilhas criadas pelas piores manifestações da burocracia. Em matéria de regulação, o Brasil está muito longe das melhores práticas e “mais ou menos no nível dos países da OCDE com as piores notas”, disse num seminário no Insper, em São Paulo, o economista Luiz de Mello, diretor adjunto de Governança Pública e Desenvolvimento territorial da Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE). A reunião foi um raro evento dedicado a um dos pontos mais vulneráveis da economia brasileira.

Interesses partidários e objetivos de curto prazo, muitas vezes vinculados a jogadas eleitorais, privam o Brasil de um sistema regulatório digno de um país civilizado e comprometido com padrões de modernidade e políticas sérias de desenvolvimento. Dez agências federais de regulação (Aneel, Anatel, Anac, Antaq, ANP, ANTT, Anvisa, ANS, Ancine e Ana) funcionam cada uma com normas próprias e nenhuma com a autonomia necessária para uma atuação baseada estritamente em critérios técnicos. As intervenções do Executivo na formação de preços – como os da eletricidade e dos combustíveis – atestam a incapacidade das agências para fixar políticas de longo prazo, essenciais para muitas decisões de investimento e de orientação dos negócios.

Mas a ingerência governamental vai muito além da fixação – em geral desastrosa – de preços e tarifas. A nomeação de diretores é sujeita a interesses partidários e tem pouca relação com as conveniências técnicas de regulação setorial. O governo tanto pode intervir apontando nomes quanto simplesmente negligenciar o preenchimento de cargos. Já houve casos de agências privadas por longo tempo do quórum necessário para deliberações de diretoria.

Projetos discutidos no seminário do Insper poderão proporcionar, se aprovados, um mínimo necessário de uniformização dos padrões de funcionamento das agências. Poderão tornar mais transparente a operação e a gerência das entidades de regulação e diminuir a influência política na formação das diretorias.

Um dos projetos, o 495/2015, do Senado, ainda propõe a extensão das normas à Comissão de Valores Mobiliários (CVM), à Superintendência de Seguros Privados (Susep) e à Superintendência Nacional da Previdência Complementar (Previc). Mas qualquer projeto sério e moderno sobre o assunto dependerá de condições políticas até agora inexistentes.

O ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva deu sinais, mais de uma vez, de ser incapaz de entender a conveniência de agências autônomas e orientadas por padrões técnicos. A presidente Dilma Rousseff seguiu a mesma concepção, defendendo a subordinação das agências ao Executivo. O estilo petista sempre incluiu, desde o primeiro mandato do presidente Lula, o loteamento de postos nas estatais e nas agências, assim como intervenções nos preços, nos investimentos e até nas funções das empresas. A quase destruição da Petrobrás é efeito desse padrão.

Uma política séria, indispensável para a segurança jurídica e para a correta sinalização aos mercados, deverá incluir a autonomia das agências, com mandatos para diretores e critérios técnicos de nomeação. Será conveniente estender o mesmo padrão ao Banco Central e aos demais órgãos envolvidos na regulação dos negócios, como o Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade). Um sistema eficiente deverá também disciplinar a relação entre as agências e o Judiciário. Num caso citado no seminário, a decisão foi alterada 12 vezes entre a deliberação do Cade e a palavra final da Justiça – ótimo exemplo de como espantar o investidor.