28 de setembro de 2015 | 03h00
A explicação pode estar no fato de que os brasileiros em geral confundem democracia com prosperidade. Se o País vai bem, se há estabilidade, emprego e aumento da renda, cresce muito o nível de satisfação com a democracia. Foi o que se constatou no final do ano passado, quando ainda se vivia a fantasia criada pelos marqueteiros petistas a respeito do estado da economia.
Na ocasião, a pesquisa do Ibope indicou que 39% dos brasileiros se diziam satisfeitos com a democracia, o maior nível desde 2010. Estava claro que parte desse entusiasmo podia ser atribuído aos eleitores da presidente Dilma Rousseff, que havia sido reeleita fazendo uma campanha em que prometia mundos e fundos, uma continuação do logro lulopetista para iludir os mais pobres. Tanto que o maior porcentual de satisfeitos com a democracia estava no Nordeste (50%) e entre os que estudaram até o ensino fundamental (44%).
Em contraste, a pesquisa feita após as manifestações de 2013 indicou que apenas 26% estavam satisfeitos com a democracia. Eram tempos em que políticos e governantes em geral estavam sendo responsabilizados pela má qualidade dos serviços públicos - ou seja, nada a ver com a qualidade da democracia em si, mas com a incapacidade da classe política de inspirar confiança nos eleitores no que diz respeito à administração do Estado.
Agora, no entanto, encontramo-nos em outro patamar de desencanto com a democracia. Passam de 80% os brasileiros que se dizem pouco ou nada satisfeitos com esse regime. Como lembra José Roberto de Toledo, que divulgou a pesquisa em sua coluna no Estado, trata-se de um porcentual desconhecido mesmo em nações com imenso déficit de democracia na América Latina, como a Venezuela. No país governado pelo aprendiz de caudilho Nicolás Maduro, em que as eleições servem somente para legitimar o autoritarismo chavista, apenas 22% se dizem insatisfeitos com a democracia, segundo a mais recente pesquisa do Latinobarômetro (ver abaixo o editorial Desencanto generalizado). Na Bolívia, onde Evo Morales também tudo faz para se perpetuar no poder, os críticos da democracia são 10%.
A insatisfação dos brasileiros com a democracia é certamente um reflexo da imensa crise moral que se abateu sobre a classe dirigente, especialmente a partir do mau exemplo dado por aqueles que, quando estavam na oposição, diziam ser o antídoto para a corrupção e os desmandos, e que, quando chegaram ao poder, há uma década, estabeleceram um novo patamar de rapina.
Mas isso não explica tudo. Lula foi reeleito presidente no auge do escândalo do mensalão, e a petista Dilma Rousseff elegeu-se duas vezes mesmo depois que vários dirigentes de seu partido foram presos por corrupção. A questão, portanto, é outra: a decepção com os políticos, com a política e com a democracia aumenta quando se deteriora o cenário econômico e se constata que o governo e o Congresso não entregaram o que prometeram. A democracia tem sido vista pelo eleitor, portanto, como um meio para garantir ganhos pessoais; se os ganhos não aparecerem, culpe-se a democracia.
“É sinal de que os valores democráticos não estão arraigados”, disse Marcia Cavallari, do Ibope. O problema é claro: aceita-se a democracia como a melhor forma de governo, desde que os eleitos garantam emprego, renda e benefícios. Trata-se de uma forte vocação para o populismo.
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