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Dinheiro fácil

Partidos deveriam ser totalmente financiados por recursos doados por cidadãos

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Por Redação
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O País terá atingido estágio de pleno amadurecimento democrático quando os partidos políticos, como organizações privadas que são, passarem a ser totalmente financiados por recursos doados por cidadãos simpatizantes de suas agendas programáticas e candidaturas.

Tal como está, o modelo de financiamento público dos partidos políticos atenta contra a liberdade de escolha dos cidadãos, obrigando-os a arcar com os custos de legendas com as quais, não raro, não têm qualquer afinidade política e ideológica. A ser verdade a afirmação segundo a qual “a democracia tem um custo”, como argumentam os defensores do financiamento público dos partidos, este custo não é do conjunto de contribuintes.

Entretanto, enquanto durar o Fundo Especial de Financiamento de Campanha (FEFC), o chamado fundo eleitoral, uma excrescência que apenas este ano destina cerca de R$ 1,7 bilhão para financiamento de campanhas em recursos do Orçamento, o mínimo a esperar seria um rígido controle, pela Justiça Eleitoral, da distribuição e destinação desses vultosos recursos.

Não é o que tem ocorrido, de acordo com Luiz Carlos dos Santos Gonçalves, procurador regional eleitoral de São Paulo. Em entrevista ao Estado, o procurador disse não se recordar de “situação na história recente do País na qual se deu tanto dinheiro a um determinado segmento exigindo tão pouca coisa em troca”. Para ele, a Lei n.º 13.487/2017, que instituiu o FEFC, é uma lei “muito peculiar”. “É muito dinheiro público dado sem cautela e sem restrições”, disse.

De fato, não há controle sobre as verbas públicas destinadas aos partidos políticos – e isso é grave. Mas esse descontrole não é inédito e tampouco o mais alarmante, em que pese a declaração do procurador regional eleitoral. Basta lembrar o bilionário montante de repasses federais que é feito à estrutura sindical sem qualquer tipo de controle pelo Tribunal de Contas da União (TCU) desde que o então presidente Lula da Silva vetou o artigo da Lei n.º 11.648/2008 que previa a fiscalização desses repasses pelo TCU.

As diretrizes gerais para a distribuição e gestão do FEFC são dadas pela Resolução n.º 23.568/2018 do Tribunal Superior Eleitoral (TSE). O artigo 5.º determina que os recursos do fundo eleitoral serão distribuídos aos diretórios nacionais dos partidos políticos na seguinte proporção: 2% divididos igualitariamente entre todos os partidos com estatutos registrados no TSE; 35% divididos entre os partidos que tenham pelo menos um representante na Câmara dos Deputados, na proporção do porcentual de votos por eles obtidos na última eleição geral para a Casa; 48% divididos entre os partidos, na proporção do número de representantes na Câmara dos Deputados; e 15% divididos entre os partidos na proporção do número de representantes no Senado Federal.

Uma vez repassados os recursos públicos às agremiações políticas, quase nenhum controle é exercido, ficando a gestão do dinheiro público a critério da livre deliberação dos caciques partidários, que podem dispor sobre as formas de administração dos recursos como lhes aprouver. É o que dispõe o artigo 6.º da referida Resolução do TSE: “Os recursos do FEFC ficarão à disposição do partido político somente após a definição dos critérios para sua distribuição, os quais devem ser aprovados pela maioria absoluta dos membros do órgão de direção executiva nacional do partido”.

Para o procurador regional eleitoral de São Paulo, trata-se de “muito poder nas mãos das direções partidárias”, citando a título de exemplo a regra que prevê o repasse obrigatório de 30% do volume de recursos para candidatas mulheres. “O partido pode escolher uma candidata e depositar os 30% só para ela”, afirmou.

O uso de recursos públicos para o financiamento de partidos e campanhas eleitorais não contribui para o aprimoramento da democracia. Na medida em que recebem grandes somas de dinheiro fácil, livre de esforços de convencimento, os partidos não têm qualquer estímulo para mudar seus métodos de ação e, desta forma, aproximarem-se de eleitores que os financiem.