
28 de março de 2011 | 00h00
Pelo projeto, que já passou pelas comissões técnicas, os contribuintes poderão repatriar esses bens e recursos e regularizar sua situação fiscal desde que paguem um imposto de 5% em cota única - ou de 10%, se for parcelado - sobre o valor repatriado. Emenda apresentada pelo relator na Comissão de Constituição e Justiça, senador Garibaldi Alves Filho (PMDB-RN) - atual ministro da Previdência -, permite que esses porcentuais sejam reduzidos pela metade caso 50% do valor repatriado seja aplicado em títulos de empresas brasileiras no exterior e em cotas de fundos de investimento em projetos de habitação, agronegócio e pesquisa científica.
Delegados de polícia, auditores da Receita, promotores de Justiça, juízes criminais e procuradores da Fazenda estimam em US$ 100 bilhões o montante que poderia ser repatriado sem sanções pecuniárias e condenações judiciais, caso o projeto seja aprovado. Para o autor da proposta, esse é "um dinheiro novo" que poderia ser investido em infraestrutura, num momento em que faltam recursos suficientes para preparar o setor para as obras para a Copa de 2014 e a Olimpíada de 2016. Ele também afirma que caberá ao Banco Central "separar o dinheiro bom do dinheiro ruim". Para Amaral, muito "dinheiro bom" teria sido enviado para o exterior apenas por uma "questão de proteção contra os planos econômicos". Para os senadores que estão apoiando sua proposta, como a maior parte do dinheiro mantido ilegalmente fora do País foi enviada para o exterior há muito tempo, muitos crimes de evasão de divisas já estariam prescritos.
Mas, para os integrantes da Estratégia Nacional de Combate à Corrupção e à Lavagem de Dinheiro (Enccla), grupo de técnicos dos Três Poderes que atuam no combate a delitos financeiros e evasão de divisas, o Projeto n.º 354/09 - chamado por seu autor de Lei da Cidadania Fiscal - fere o princípio constitucional da moralidade e vai muito além de regularizar a situação fiscal de sonegadores contumazes e de legalizar ativos constituídos de forma criminosa. Entre outras consequências, impediria o Ministério Público de apurar a fonte dos recursos e de levantar ativos bloqueados no exterior.
"É um estímulo à criminalidade organizada, um verdadeiro retrocesso no combate à corrupção", diz a direção do Conselho Nacional dos Procuradores-Gerais de Justiça. "Os efeitos do projeto alcançarão situações preexistentes, invalidando investigações e ações penais já instauradas, mesmo se houver condenações. A proposta de repatriação sem punição fragiliza a atividade repressiva do Estado, que ficará na contramão do combate ao crime de lavagem", assinala a Enccla.
O grupo também lembra que a anistia fiscal e criminal prevista pelo Projeto n.º 354/09 colide com tratados internacionais firmados pelo Brasil. E um eventual descumprimento desses acordos tornaria o País vulnerável principalmente a sanções do Grupo de Ação Financeira contra Lavagem de Dinheiro (Gafi) - vinculado à Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE). Em vigor desde 1998, a legislação brasileira nessa matéria foi elaborada com base numa atuação conjunta dos Ministérios da Fazenda e da Justiça com o Gafi.
Se o projeto de Amaral estivesse em vigor, lembram os membros do Enccla, o Ministério Público não teria como pedir o bloqueio das contas mantidas pelo ex-prefeito Paulo Maluf nas Ilhas Jersey.
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