Imagem ex-librisOpinião do Estadão

Doações eleitorais e lobbies

Exclusivo para assinantes
Por Redação
3 min de leitura

Há um assunto que quando surge na mídia vem sempre carimbado com as tintas espalhafatosas do escândalo. Referimo-nos às doações eleitorais. Até se entende que o público associe a doação eleitoral a algo escuso, tamanhas têm sido as irregularidades - do tipo mensalão, caixa 2 -, quando não os crimes eleitorais propriamente ditos, que têm povoado o noticiário político. Não tem sentido, no entanto, "demonizar" o sistema de financiamento das campanhas eleitorais, por parte de pessoas e empresas, pois essa prática é perfeitamente permitida pela legislação vigente. Há que se reconhecer que certas questões não foram bem definidas na legislação eleitoral ou correlata - como é o caso da falta de normas para a atuação dos lobbies no Legislativo -, o que tem dado margem a discutíveis cobranças. O Ministério Público (MP) Eleitoral, por exemplo, representou contra 28 vereadores da Câmara Municipal de São Paulo por terem sido beneficiados com doações da Associação Imobiliária Brasileira (AIB) nas eleições de 2008. Depois de ter sido alvo de investigação, por ter doado R$ 10 milhões a partidos e candidatos, a entidade assinou, na segunda-feira, com representante do MP Eleitoral, um Termo de Ajustamento de Conduta (TAC), no qual se compromete a não mais contribuir para campanhas eleitorais, sob pena de multa equivalente a 10 vezes o valor doado. Com esse acordo a AIB se livra de uma eventual ação judicial - embora o próprio representante do MP tenha dito que, "se essa questão tivesse de ser resolvida na Justiça Eleitoral, levaria vários anos e o resultado seria incerto". Curioso é que, na hipótese de condenação judicial por doação irregular, a legislação determina que a multa (de 5 a 10 vezes o valor doado) seja revertida para o Fundo Partidário. Essa incongruência levou o representante do MP Eleitoral a dar uma segunda explicação para o TAC: "Não se trata de uma anistia à AIB. O MP só não acha moral que o dinheiro volte para os cofres de quem não podia recebê-lo." Para o MP, as doações feitas pela AIB desrespeitaram o artigo 81 da Lei Eleitoral, que veda repasses de pessoas jurídicas acima de 2% de seu faturamento bruto. "Uma entidade sem fins lucrativos não tem receita e, portanto, não pode realizar doações de campanha", argumentou o MP. Mas o presidente da AIB rebate: "Fizemos as contribuições com base nas receitas de nossos colaboradores. Na nossa ótica, não houve ilegalidade, mas, para que não pairem dúvidas, resolvemos assinar esse TAC." Esse acordo não livra de processo os 28 vereadores. Se condenados, perderão o mandato e ficarão inelegíveis por 4 anos. A questão suscita uma importante questão, relativa ao sistema de representação parlamentar. O presidente da AIB esclareceu qual foi o critério para a escolha dos candidatos que receberam doações da entidade. "Privilegiamos quem historicamente conhece o assunto." Questione-se então: uma entidade associativa - que não sofre os impedimentos legais que têm, por exemplo, os sindicatos - pode favorecer, com doações eleitorais, candidatos que defendam seus específicos interesses? É ou não legal e legítimo que o faça? Há pouco tempo uma polêmica envolveu o presidente da Federação das Indústrias do Estado de São Paulo (Fiesp) pelo fato de a entidade dos industriais paulistas - impedida por lei de fazer doações eleitorais - ter recomendado a empresas associadas que contribuíssem para as campanhas de candidatos afinados com as ideias e reivindicações do setor. A legislação não deixa dúvidas. É perfeitamente legítimo que empresas e cidadãos contribuam para a campanha eleitoral de um candidato que julguem afinado com seus interesses e pretenda defendê-los em sua atuação parlamentar. Isso faz parte das regras da democracia representativa. Há, no entanto, uma complicação de entendimento quando a questão resvala para um tema paralelo e bem próximo deste: o da atuação dos lobbies. Há décadas que é necessária a regulamentação da atividade lobística - no Brasil frequentemente exercida "por debaixo do pano", sempre levantando suspeitas. Um dos que se têm preocupado com o disciplinamento jurídico dos lobbies - e tem projeto de lei, neste sentido - é o senador e ex-vice presidente da República Marco Maciel. Mas este é assunto - como tantos outros - emperrado no Congresso, apesar de sua inegável importância para a vida política nacional.