28 de novembro de 2014 | 02h03
Os relatórios do Painel Intergovernamental de Mudanças Climáticas (IPCC) são categóricos: é preciso reduzir até 2050 as emissões em 40% a 70% do que são hoje para impedir que a temperatura do planeta suba mais que 2 graus Celsius (já subiu 0,85% em relação ao século 19); e chegar a zero nas emissões até o fim deste século. O último relatório, de 5 mil páginas, foi escrito por 800 cientistas, que reviram os estudos de mais de 30 mil no mundo todo. Por isso o secretário-geral da ONU, Ban Ki-moon, é categórico. "A ciência já falou. Não há ambiguidade. É hora de agir", disse ele na última reunião do IPCC, em Copenhague.
E as tarefas não são fáceis. Em 2030 é preciso emitir 15% menos do que em 2010. É preciso trabalhar imediatamente no reflorestamento para que as áreas recuperadas ajudem na redução de temperaturas; avançar com a eficiência energética, que pode ajudar a reduzir a quantidade de poluentes emitidos na queima de combustíveis fósseis (carvão, óleo, gás) entre 3 bilhões e 7 bilhões de toneladas anuais de dióxido de carbono equivalente. Mas um dos avanços que também se conseguiria com isso seria reduzir os 7 milhões de mortes anuais por causa da poluição do ar (estudo da Organização Mundial de Saúde) na Índia, no Brasil, na China, no México e nos Estados Unidos - além da geração de 7 milhões de empregos nas áreas de energias renováveis. Tudo isso feito, as emissões anuais, que estarão em 47 gigatoneladas de CO2 em 2025, chegariam a 2050 com 22 gigatoneladas (55% menos que em 2012). Se nada for feito, poderemos chegar a 87 gigatoneladas em 2050.
Mas para avançar, calcula sir Nicholas Stern, estudioso respeitado, é preciso investir nos próximas anos nada menos que US$ 90 trilhões (quase 40 vezes o PIB brasileiro). E, pensam os cientistas, eliminar os subsídios ao consumo de combustíveis fósseis, hoje na casa dos US$ 600 bilhões por ano. E seguir nos caminhos de 2012, quando foram investidos cerca de US$ 360 bilhões em programas de eficiência energética, além de US$ 244 bilhões em energias renováveis.
Há quem veja como sinal para otimismo o fato de Estados Unidos e China (que, juntos, emitem 45% do total de poluentes, hoje) haverem firmado acordo pelo qual os norte-americanos se comprometem a reduzir suas emissões entre 26% e 28% até 2025, enquanto os chineses só diminuirão em 20% seu consumo de combustíveis fósseis a partir de 2030. Os mais céticos ironizam as datas. E François Hollande, presidente da França, pede mais pressa, porque um fracasso no acordo global "pode levar à guerra" e à "catástrofe" (Business and Financial News, 7/11). Angela Merkel, a chanceler alemã, pede à Austrália que reveja sua posição contra o acordo: os desastres do clima "não se limitarão a algumas ilhas do Pacífico, atingirão todos os países" (17/11).
Por essas e outras, diz um dos relatórios da ONU (AP, 19/11) que o mundo ainda não está no caminho de evitar os perigos gerados pelas ações humanas; seria preciso baixar as emissões para 42 bilhões de toneladas métricas de CO2 em 2030 - quando as projeções de hoje são para 15 bilhões a 19 bilhões de toneladas acima disso.
Há países já francamente assustados. O Nepal, por exemplo, mostra que a cobertura de gelo em suas montanhas se reduziu em 1.266 quilômetros quadrados em duas décadas - e o abastecimento de água de milhões de pessoas depende dela. Botswana demonstra que secas e inundações estão arrasando o país . O Banco Mundial manifesta preocupação com o que está acontecendo na Groenlândia e na Antártida. Se as temperaturas continuarem a subir, afirma (23/11), o nível dos oceanos poderá elevar-se em até 2,3 metros nos próximos séculos. Colheitas de soja no Brasil poderão baixar 70%; de trigo, 50%. O oeste dos Estados Unidos enfrenta uma sucessão de nevascas (dez pessoas morreram na última). A área dos vinhos na França está sofrendo com calor inédito e tempestades de granizo (Estado, 16/11). Lembra o Peru que em 30 anos os Andes perderam pelo menos 30% da cobertura de gelo.
Não estranha. De janeiro a outubro deste ano a temperatura média global esteve em 14,78 graus Celsius, a mais alta desde 1880, segundo a Agência de Administração Oceânica e da Atmosfera (NOAA), dos EUA. Ou 0,68 grau acima da média do século 20; recorde em cinco dos últimos seis meses.
Dinheiro resolveria, como o do Green Climate Fund, com o qual se espera reunir US$ 100 bilhões anuais para ajudar os países mais pobres e vulneráveis? Mesmo que seja, até agora só reuniu US$ 5 bilhões.
No Brasil, continuamos mergulhados em polêmica. Diz o Observatório do Clima (Estado, 25/11) que em 2013 aumentaram nossas emissões (1,57 bilhão de toneladas de CO2, mais 7,8%); diz o Ministério do Meio Ambiente que a metodologia oficial difere da que é usada nessa medição. Mas é tudo muito preocupante com os números sobre a perda de florestas - que está influenciando no clima, nas chuvas, no abastecimento.
WASHINGTON NOVAES É JORNALISTA. E-MAIL: WLRNOVAES@UOL.COM.BR
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