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E os TRFs foram criados

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Por Redação
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Em sessão esvaziada, com a presença de poucos parlamentares no plenário e muitos juízes nas galerias, o Congresso Nacional promulgou a Emenda Constitucional (EC) n.º 73, que cria Tribunais Regionais Federais (TRFs) nos Estados de Minas Gerais, Bahia, Amazonas e Paraná. A sessão foi convocada pelo vice-presidente da Câmara dos Deputados, André Vargas (PT-PR), uma vez que o senador Renan Calheiros (PMDB-AL) se encontra em missão parlamentar no exterior. A criação dos quatro novos Tribunais Regionais Federais - que sofreu forte resistência do Supremo Tribunal Federal - foi aprovada no início de abril graças a um poderoso lobby de governadores, políticos e entidades de magistrados. Na ocasião, o presidente do Supremo Tribunal Federal alegou que a expansão da segunda instância da Justiça Federal era desnecessária, pois os cinco Tribunais Regionais Federais já existentes - com sede em Brasília, São Paulo, Rio de Janeiro, Recife e Porto Alegre - já dão conta do recado. Disse que a proposta de criação de quatro cortes carecia de fundamentação técnica. Alegou que o custeio dos novos tribunais custará cerca de R$ 8 bilhões aos cofres públicos. Afirmou que a Justiça Federal já tem uma "quantidade exagerada" de servidores e que a instalação de mais quatro cortes aumentará o "inchaço do Poder Judiciário", além de permitir que parlamentares e dirigentes judiciais empreguem apadrinhados e parentes. E ironizou os juízes que defenderam a aprovação da EC 73, lembrando que com a multiplicação de Tribunais Regionais eles teriam mais oportunidade de ser promovidos a desembargadores. O presidente do Supremo também cobrou dos dirigentes das três maiores associações de juízes mais responsabilidade em suas reivindicações políticas e corporativas. E, numa iniciativa inédita, recebeu-os em audiência e lhes passou uma descompostura pública, afirmando que os líderes sindicais da magistratura carecem de legitimidade política. "Não confundam a legitimidade que os senhores têm como representantes sindicais com a legitimidade dos órgãos do Estado. Vocês participaram de forma sorrateira na aprovação da EC 73", afirmou o ministro Joaquim Barbosa. Advertido pela cúpula do Supremo Tribunal Federal e pelo Palácio do Planalto para as consequências da duplicação da segunda instância da Justiça Federal, em matéria de aumento de gastos e de fisiologismo político, o senador Renan Calheiros recusou-se a promulgar a EC 73. Também pediu à sua assessoria jurídica que identificasse eventuais irregularidades e vícios de constitucionalidade no texto, o que lhe permitiria submeter novamente o assunto ao plenário. Pela Constituição, a criação de novos tribunais tem de ser proposta pelo Poder Judiciário ao Congresso. Mas o projeto de criação de quatro TRFs foi apresentado por iniciativa de um senador. Apesar do vício de inconstitucionalidade da EC 73, o deputado André Vargas aproveitou sua interinidade na presidência do Congresso para promulgar a emenda. Um dos novos TRFs será instalado em Curitiba, a capital de seu Estado. Ao justificar a iniciativa, o parlamentar paranaense alegou que estava "homenageando o povo brasileiro". Outros políticos tiveram a mesma reação - o senador Clésio Andrade (PMDB-MG), por exemplo, classificou a criação de um TRF em Belo Horizonte como "vitória dos mineiros". Houve até quem dissesse que, com a promulgação da EC 73, a Justiça Federal julgará pedidos de revisão de aposentadorias e ações criminais mais rapidamente, "garantindo justiça para os brasileiros". Esses argumentos são demagógicos. Para desafogar a segunda instância bastaria à Justiça Federal instalar Câmaras Regionais ligadas aos TRFs existentes - medida prevista pela Constituição. E como a EC 45 criou a súmula vinculante, a cláusula impeditiva de recursos e o princípio da repercussão geral com o objetivo de reduzir o número de recursos nas instâncias superiores do Judiciário, por que criar mais Tribunais Regionais Federais se a tendência é de redução de carga de trabalho dessas cortes?