Imagem ex-librisOpinião do Estadão

É preciso ouvir o alarme

Quanto mais improvável o apoio à reforma da Previdência, mais provável o corte na nota do País

Exclusivo para assinantes
Por Redação
2 min de leitura

O governo tem de se preocupar com o risco de mais um rebaixamento da nota de crédito do Brasil, desta vez pela Moody’s, uma das três mais importantes avaliadoras de risco. A perspectiva do País já é negativa desde maio, lembrou a vice-presidente da agência, Samar Maziad, e a pauta de reformas continua atrasada. O progresso da agenda, acrescentou, seria “muito importante” para estabilizar a classificação brasileira. Um novo corte da nota “é certamente um resultado possível” da próxima análise das condições brasileiras, disse, na quinta-feira passada, a executiva em Nova York, numa entrevista ao Broadcast, serviço de notícias em tempo real da Agência Estado. No mesmo dia, foi anunciada em Brasília a captação de US$ 1,5 bilhão no exterior, por meio da emissão de um bônus do Tesouro, o Global 2047, com prazo de 30 anos.

A taxa negociada, de 5,6%, foi mais baixa que aquela cobrada pelos aplicadores no lançamento inicial do título, em julho de 2016. Naquele momento, o custo chegou a 5,87%. A nova negociação ocorreu pouco depois de um novo corte da nota de crédito do Brasil, anunciado no dia 11 pela Standard & Poor’s (S&P). Em 2015, o País foi rebaixado ao grau especulativo pelas três principais agências, a S&P, a Moody’s e a Fitch. Em 2016, pouco antes do afastamento da presidente Dilma Rousseff as três classificadoras anunciaram um segundo corte. Com isso, a nota brasileira ficou dois níveis abaixo do grau de investimento. A nova decisão da S&P pôs o País três níveis abaixo.

O mercado reagiu como se esse novo corte fosse pouco importante. Na prática, foi atribuído maior peso à recuperação econômica iniciada em 2017, ao começo de retomada do emprego num quadro de inflação baixa e às perspectivas de crescimento mais acelerado em 2018. Esses fatores positivos foram mencionados no informe da S&P, no começo de janeiro, e citados na entrevista da vice-presidente da Moody’s.

Nem as incertezas ligadas à disputa eleitoral parecem ter muita relevância, neste momento, no jogo do mercado financeiro. Mas é aconselhável, para avaliar esse quadro com alguma segurança, levar em conta as condições ainda muito favoráveis do mercado financeiro internacional e a recuperação, aparentemente firme, da economia global.

O cenário externo pode mudar, no entanto, e é preciso levar em conta, em primeiro lugar, o aperto gradual das condições monetárias nos Estados Unidos. A Europa deverá seguir o mesmo caminho, um pouco mais tarde. Além disso, analistas têm mostrado inquietação diante dos possíveis efeitos do populismo nacionalista do presidente americano, Donald Trump, e das tendências protecionistas observadas em vários outros países avançados.

Se o cenário global se tornar menos confortável, a classificação do Brasil no chamado grau especulativo poderá ser levada em conta muito mais seriamente do que hoje. A preocupação demonstrada pela vice-presidente da Moody’s em relação às condições fiscais do País é mais um alerta importante.

Em sua entrevista, a executiva chamou a atenção para as prováveis dificuldades fiscais do próximo governo. As despesas obrigatórias continuam crescendo mais velozmente que a receita líquida do governo. Respeitar a meta fiscal, evitar o rompimento do teto de gastos e preservar a regra de ouro (proibição de tomar empréstimos para cobrir custeio) serão tarefas cada vez mais difíceis. Atender a esses critérios ainda será possível neste ano, mas o novo governo receberá uma herança muito ruim, lembrou a entrevistada. O crescimento econômico, argumentou, será insuficiente para garantir a gestão fiscal necessária.

A equipe econômica sabe disso, mas depende de apoio parlamentar para a aprovação da reforma da Previdência, a mais urgente. Esse apoio, lembrou a dirigente da Moody’s, parece muito improvável neste ano. Quanto mais improvável esse apoio, mais prováveis novos cortes da nota brasileira e tanto piores as possibilidades econômicas do País nos próximos anos. Quantos, em Brasília, reconhecerão essa obviedade?