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Opinião|Educação integral - qualidade e equidade

Atualização:

Pôr em prática políticas de educação integral no Brasil – não apenas para que se atinja a meta prevista no Plano Nacional de Educação (PNE), mas para efetivamente melhorar a aprendizagem dos alunos – é um desafio enorme. E urgente. O Brasil tem uma rede de educação básica ampla e complexa – quase 50 milhões de alunos, 2 milhões de professores e 200 mil escolas –, profundamente marcada pela desigualdade das condições de infraestrutura, da formação dos professores e gestores, das condições de apoio e do nível socioeconômico dos alunos, o que faz as escolas, frequentemente num mesmo município, apresentarem resultados muito díspares. A educação integral tem sido apontada como um caminho importante para ajudar o País a avançar na qualidade do ensino público e também como fator estratégico para a redução da desigualdade, principalmente no que se refere a escolas que atendem alunos em situação de maior vulnerabilidade. Mas para que a educação integral tenha esse efeito transformador é preciso entender que se baseie no conceito de desenvolvimento pleno do ser humano, que considera diferentes dimensões: física, afetiva, cognitiva, socioemocional e ética. O conceito é aprofundado no documento Educação integral – um caminho para a qualidade e a equidade na educação pública, construído a partir de discussões de um grupo de especialistas da área educacional sobre o tema, cujo objetivo é contribuir para o debate sobre o que se entende por educação integral, para além da ampliação da jornada escolar, alargando as oportunidades de aprendizagem das crianças e dos jovens do Brasil. Na publicação avalia-se que ter um plano e construí-lo em consonância com o projeto político-pedagógico da rede de ensino e com a participação de docentes, famílias, comunidade e alunos é primordial para a qualidade e a sustentabilidade das propostas de política pública de educação integral. Exemplos de redes de ensino que investiram nesse princípio mostram a intencionalidade pedagógica do modelo adotado e levam em consideração as demandas e as necessidades de toda a comunidade escolar como fatores-chave, embora não únicos, do sucesso de um plano de educação integral. A adequação ao contexto local é outra característica que distingue as experiências bem-sucedidas. A meta 6 do PNE, que trata da educação em tempo integral – termo já bastante contestado por apontar apenas para o aumento da jornada escolar, suprimindo um debate mais aprofundado sobre o conceito do desenvolvimento integral do aluno –, tem estratégias que abordam a diversidade local e a articulação no território como aspectos a serem considerados no desenho das políticas públicas. Mesmo os países que já garantem as sete horas diárias na escola a todos os alunos têm passado a investir em espaços que não fazem parte da estrutura formal da escola como parceiros na ampliação das oportunidades de aprendizagem. Isso significa que não apenas as secretarias de educação, mas diferentes áreas do governo e da sociedade civil podem e precisam participar no desenvolvimento das políticas de educação integral, para que se garanta o compromisso da gestão municipal com a disponibilização de espaços e o planejamento de atividades pedagogicamente relevantes e que tenham significado no contexto cotidiano dos alunos. Assim, ao incluir no planejamento os equipamentos culturais e esportivos das cidades, por exemplo, é preciso levar em conta o modo como eles podem ser acessados e de que forma serão integrados ao projeto político-pedagógico das escolas para promover o desenvolvimento das crianças e dos jovens. Isso requer conversa e cooperação entre a secretaria de educação e as outras pastas da administração pública responsáveis pelas políticas de cultura, esportes, assistência social, transportes e mobilidade, entre outras. Nessa interação com o território, o envolvimento de organizações sociais que oferecem projetos socioeducativos a crianças e jovens é igualmente estratégico, mas, assim como em relação a todos os demais atores, esse envolvimento deve ter como alicerce a relevância para o desenvolvimento dos alunos em articulação com a escola. Para que essa rede articulada funcione é fundamental que se pense na formação docente e dos profissionais da educação e das demais áreas envolvidas nas atividades propostas. O plano de educação integral precisa, além disso, considerar paralelamente todas as questões específicas de cada etapa escolar, como o ensino médio, fase em que as características da juventude precisam ser levadas em conta no planejamento das ações, de modo a promover o protagonismo dos jovens e sua relação com os espaços e a cidade. Nos diversos exemplos apresentados na publicação referida neste texto, fica claro que não há um modelo único. Cada localidade e, no limite, cada escola deve encontrar o seu – de acordo com a proposta pedagógica vigente, as demandas da comunidade escolar, as condições de infraestrutura, a integração com os equipamentos esportivos e culturais e a capacidade de atendimento. De fato, podem coexistir diferentes formatos de educação integral dentro de uma mesma rede de ensino. Mas é importante destacar que na maioria dos casos é necessário investir mais recursos tanto na melhora das condições dos prédios escolares – garantindo espaços e materiais adequados para a aprendizagem – como na contratação ou na adequação da jornada de trabalho docente e formação dos professores, e ainda prever recursos de outras pastas envolvidas. O grupo de especialistas envolvidos nesse debate foi taxativo quanto à importância de começar pela formulação de um bom plano de educação integral para que a execução dessa política não fique pela metade. Mas é primordial implementá-lo com excelência para que ele faça a diferença na aprendizagem e na vida das crianças e dos jovens.

Opinião por Alejandra Meraz Velasco
Patrícia Mota Guedes
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