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Opinião|Em busca do equilíbrio financeiro da USP

A situação ‘despiorou’, mas ainda está longe de ser observado o limite prudencial

Atualização:

Há sete anos a USP vem acumulando sucessivos déficits, que praticamente dissiparam suas reservas financeiras, que de mais de R$ 3 bilhões em 2011 se reduziram a R$ 87 milhões ao final de 2017. Esse persistente desequilíbrio entre receitas e despesas contraria a Lei de Responsabilidade Fiscal e põe em risco a sua autonomia financeira.

A receita total da USP é constituída pela receita do Tesouro do Estado, dependente da arrecadação do ICMS, e pela receita própria, cuja participação está reduzida a 2% em 2018, com significado claro: o financiamento da USP reduziu-se aos recursos provenientes do Tesouro do Estado. A despesa total é constituída principalmente pela despesa de pessoal.

Para enfrentar essa situação de desequilíbrio financeiro o Conselho Universitário aprovou a Resolução 7.344/2017, que dispõe sobre parâmetros de sustentabilidade econômico-financeira da USP, cujo principal parâmetro é a relação entre as médias flutuantes dos últimos 12 meses da despesa de pessoal e da receita do Tesouro, com a meta de atingir o limite prudencial de 80%, em 2022. Em setembro de 2018, esse parâmetro atingiu o valor de 90% que é um resultado alentador, fruto das duras medidas de austeridade aplicadas no período de 2014 a 2017. Entretanto, há um longo caminho a ser percorrido para se atingir o limite prudencial e os instrumentos necessários para esse objetivo estão praticamente restritos à expectativa de aumento da receita do Tesouro e de controle da despesa de pessoal.

Na reunião do Conselho Universitário da USP em 13 de novembro foram tratados temas de fundamental importância relacionados às finanças da universidade: a segunda revisão orçamentária de 2018 e as diretrizes orçamentárias para 2019. 

O orçamento de 2018 e sua primeira revisão estimaram a receita do Tesouro em R$ 4,999 bilhões e a segunda revisão, em R$ 5,062 bilhões. O valor médio mensal da receita do Tesouro nos nove primeiros meses do ano foi de R$ 417 milhões, aderente ao orçamento inicial e estimativa realista para os últimos três meses do ano. Entretanto, a otimista segunda revisão orçamentária considerou um valor médio de R$ 437 milhões por mês, superior ao maior valor mensal arrecadado ao longo de 2018. Do lado das despesas, foi autorizada a contratação de 150 docentes, com aumento na despesa de pessoal de R$ 25,6 milhões por ano. Caso ela seja efetivada em 2018, o artigo 3.º das Disposições Transitórias, que limita o aumento da relação entre despesa de pessoal e receita do Tesouro, seria observado para a estimativa de receita do Tesouro da segunda revisão orçamentária de 2018, mas não se mantida a previsão da primeira revisão orçamentária de 2018.

Nas diretrizes orçamentárias de 2019 a receita do Tesouro foi estimada em R$ 5,504 bilhões, ante R$ 5,465 bilhões previstos na peça orçamentária do Estado de São Paulo. O valor adicional de R$ 39 milhões representa um exercício de otimismo. Entendo que a USP deva respeitar a previsão definida no Projeto de Lei de Diretrizes Orçamentárias para 2019, que considera uma estimativa de inflação de 4,5% e de crescimento do PIB de 2,7%. Do lado das despesas, foram estabelecidas as seguintes diretrizes para despesas adicionais de pessoal: R$ 42,6 milhões para a contratação de 250 docentes, R$ 26 milhões para a progressão horizontal na carreira para docentes e servidores, 50% para cada categoria, previsão para eventual reajuste salarial em 2019, mas sem tratar a questão do achatamento salarial, que atinge principalmente os docentes.

É reveladora a análise da redução da relação entre despesa de pessoal e receita do Tesouro em projeções otimista e realista da receita do Tesouro para o período de outubro de 2018 a dezembro de 2019, que atingem 2,1% e 1,4%, respectivamente; ambas violam o artigo 5.º das Disposições Transitórias da Resolução 7.344, que indica a redução mínima de cinco pontos porcentuais, em relação ao porcentual acumulado nos 12 meses anteriores. Se comparadas com a redução de 14,7% verificada nos 21 meses de janeiro de 2017 a setembro de 2018, observa-se um grande freio na busca do equilíbrio financeiro da USP. O otimismo faz parte da gestão de uma instituição, mas se excessivo pode criar expectativas e situações de difícil reparo, como mostra a recente história da USP.

Na próxima reunião do Conselho Universitário, prevista para 11 deste mês, será definido o orçamento da USP para 2019 e considero que algumas correções devam ser realizadas:

- A receita do Tesouro deverá ter o valor de R$ 5,465 bilhões, que foi o estabelecido na peça orçamentária do Estado de São Paulo.

- As despesas de pessoal só deverão ser executadas após a definição do reajuste salarial, a estrita observância da Resolução 7344 e seu impacto futuro.

- A despesa de pessoal no valor de até R$ 13 milhões destinada à progressão horizontal na carreira dos servidores terá seu destino modificado para a contratação de servidores, “correspondentes no máximo às vacâncias do ano anterior, não incluído nesse cômputo de vacâncias aquelas decorrentes de planos de incentivo à demissão voluntária”, conforme estabelece o artigo 7.º do capítulo 7 da Resolução 7.344.

A situação financeira da USP “despiorou”, mas está longe ainda do equilíbrio financeiro, que só será atingido quando for observado o limite prudencial. O diagnóstico do desequilíbrio financeiro foi realizado, os remédios para a superação desse desequilíbrio são conhecidos, mas é indispensável a sua aplicação, que depende da vontade política dos seus dirigentes e da comunidade da USP e do rigoroso cumprimento da Resolução 7.344. Atingir o limite prudencial é de responsabilidade da atual gestão reitoral, subsidiada pelo Conselho Universitário, e exigirá muito esforço, que não é demasiado quando se considera a inteligência disponível na Universidade de São Paulo e a confiança que a sociedade nela deposita.

*PROFESSOR TITULAR DA ESCOLA POLITÉCNICA DA USP