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Enfim, a reforma dos portos

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Por Redação
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O governo está coberto de motivos para comemorar a aprovação da MP dos Portos, não apenas porque a presidente Dilma Rousseff se envolveu pessoalmente na questão, mas, sobretudo, porque conseguiu vencer, na última hora, uma dura batalha no Congresso mesmo tendo cometido erros políticos graves e demonstrado enorme incapacidade de articular sua base parlamentar. Como o governo, o País tem motivos para celebrar a aprovação do novo marco regulatório para os portos, pois espera que, com ele, haja mais competição entre os operadores, maior eficiência e menor custo das operações portuárias, eliminando, assim, um dos piores gargalos da economia. Mas o episódio deixou evidentes muitas falhas políticas do governo, que, se não corrigidas, dificultarão ou até impedirão a aprovação de outras reformas de que o País necessita.A escolha da medida provisória para acelerar o processo de votação de uma mudança tão complexa e potencialmente geradora de conflitos, como a introduzida pela MP dos Portos, transformou-se numa armadilha para o governo. Tendo seu emprego limitado a questões de relevância e urgência - o que nunca esteve claro no caso da reforma do sistema portuário -, as medidas provisórias perdem validade se não forem transformadas em lei no prazo de 60 dias, prorrogável uma vez pelo mesmo período. Assim, era muito curto o tempo de que o Congresso dispunha para examinar o tema, ouvir as partes interessadas, analisar os conflitos entre elas e votar a proposta.Melhor teria sido o envio de um projeto de lei com pedido de tramitação em regime de urgência. Esse regime dispensa algumas exigências regimentais, permite a tramitação da proposta simultaneamente pelas comissões e não submete o Congresso a pressões tão fortes como faz a MP.Mesmo tendo sido escolhida a medida provisória, porém, é possível que, se o governo contasse com uma articulação eficaz no Congresso, muitos dos pontos que geraram tensões e se transformaram em instrumentos para retardar o processo ou para forçar barganhas teriam sido superados sem que fosse necessário ceder tanto.Mas, com lideranças frágeis, o governo não conseguiu assegurar a votação tranquila da MP, mesmo dispondo de ampla maioria nas duas Casas do Congresso. Com a validade da MP prestes a se esgotar, o governo teve de abrir mão de pontos que considerava imutáveis. Mesmo assim, esteve muito perto de sofrer uma derrota histórica.O que se viu nas discussões da MP dos Portos na comissão mista que a examinou e, especialmente, no plenário da Câmara foi uma aberta rebelião de parte do que se considera a base de apoio do governo, conduzida pelo líder do PMDB, deputado Eduardo Cunha (RJ), que retardou ainda mais a votação.À medida que se aproximava o fim do prazo de validade da MP, maiores as pressões do governo sobre o Congresso e, especialmente, maiores as concessões que o Palácio do Planalto teve de fazer, aceitando parcialmente emendas dos parlamentares ou oferecendo compensações pelo compromisso de aprovação do texto.Ressalve-se que, nesse clima de trocas explícitas, o governo conseguiu preservar pelo menos dois pontos importantes da proposta original. Um deles é a regra que permite que os novos terminais movimentem cargas próprias e de terceiros, o que aumenta o interesse dos empresários nessas operações. Outro é o que reduz o poder dos órgãos gestores de mão de obra (Ogmos), controlados por sindicatos, na contratação de serviços pelos portos privados.O texto aprovado pelo Congresso contém, no entanto, aberrações que precisam ser eliminadas. Uma delas é a emenda que abre caminho para a renovação obrigatória de contratos de terminais privados em portos públicos, pelo mesmo prazo dos contratos originais, desde que os arrendatários se comprometam a fazer investimentos.A presidente Dilma Rousseff terá de arcar com o ônus político do veto a pontos acrescentados ou mudados pelos parlamentares que desfiguram a proposta original.