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Esqueletos crescentes

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Por Redação
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Apesar da limpeza nas finanças públicas ocorrida nos últimos anos - graças a medidas como a aprovação da Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF), mais clareza nas informações sobre a utilização do dinheiro recolhido pelos contribuintes aos cofres governamentais e maior rigor na fiscalização dos gastos -, esqueletos formados há muitos anos continuam a crescer e ainda assombram os brasileiros. Fechados para novos projetos em 2001, depois de denúncias sobre desvios de recursos e favorecimento de políticos que resultaram na constituição de uma Comissão Parlamentar de Inquérito na Câmara dos Deputados, os Fundos de Investimentos do Nordeste (Finor) e da Amazônia (Finam) acumulam um rombo de R$ 12,2 bilhões. Esse montante, revelado pelo jornal Valor, refere-se ao dinheiro que as empresas incentivadas deveriam ter devolvido aos dois fundos, mas não o fizeram. Como lembrou a reportagem, esse valor é maior do que a soma dos recursos previstos para os dois maiores projetos do governo federal para o Nordeste, o de transposição do Rio São Francisco e o de construção da Ferrovia Transnordestina. O dinheiro seria importante contribuição para a redenção do Nordeste, como costumam dizer os que defendem os programas de incentivo fiscal para apoiar o desenvolvimento da região. Não se nega que os dois fundos desempenharam um papel importante para o Nordeste, parte de Minas e do Espírito Santo (áreas atendidas pelo Finor) e para a Amazônia Legal, formada por Acre, Amapá, Amazonas, Mato Grosso, Pará, Rondônia, Roraima e Tocantins (área atendida pelo Finam). Eles foram decisivos para a constituição do polo têxtil no Ceará, para a formação dos complexos hoteleiros no litoral nordestino e para a atração de grandes empresas industriais, entre as quais a Vale, Gerdau, Votorantim, Unilever, Alcoa, AmBev e Azaleia. Esses fundos foram criados em 1974 para apoiar empresas privadas instaladas ou que se instalassem nas duas regiões, carentes de poupança própria para sustentar os investimentos de que necessitavam. As empresas que recebiam recursos incentivados eram obrigadas a emitir ações e debêntures em favor dos fundos, que podiam leiloar esses papéis em pregões nas bolsas de valores (havia várias no País, na época). As empresas interessadas nos papéis podiam neles aplicar o equivalente a até 18% do Imposto de Renda devido. Papéis de empresas que cumpriram as metas propostas e apresentaram demonstrações contábeis e financeiras adequadas passaram a interessar aos investidores e a ter liquidez no mercado secundário. Mas, por falta de fiscalização ou simplesmente por má destinação dos recursos por parte de seus gestores, geralmente nomeados por critérios políticos, esses fundos começaram a acumular perdas, o que levou o governo Fernando Henrique a baixar, em 2 de maio de 2001, medida provisória extinguindo o regime de incentivo fiscal para aplicação neles e fechando-os para financiamento de novos projetos. Os então já aprovados aufeririam os benefícios, mas seus controladores comprometiam-se a cumprir exigências tais como a comprovação da regularidade do projeto, o respeito ao cronograma e aos requisitos previstos no projeto, a demonstração de capacidade para integralizar a parte que lhe cabia no capital e a emissão dos títulos devidos. Um exame mais profundo feito pelo Departamento de Gestão dos Fundos de Investimentos, o órgão do Ministério da Integração que administra e controla o Finor e o Finam (operados, respectivamente pelo Banco do Nordeste do Brasil e pelo Banco da Amazônia), constatou que, entre 2006 e 2007, o total devido ao Finor pelas empresas incentivadas saltou de R$ 4,8 bilhões para R$ 8,7 bilhões. O rombo de R$ 12,2 bilhões foi constatado nos balanços dos dois fundos publicados em 2008 e referentes a 2007. O governo tentou resolver a questão amigavelmente, mas não deve ter tido êxito. Agora, muitos casos estão com a Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional, que deve iniciar a cobrança judicial. A Comissão de Valores Mobiliários (CVM), de sua parte, suspendeu as empresas incentivadas que não enviaram as demonstrações anuais devidas. Até agora, segundo a reportagem citada, já são cerca de 2 mil empresas suspensas.