19 de maio de 2014 | 02h06
Apesar da lei e da clara sinalização política feita pela presidente da República, e não obstante ainda o poder público demonstrar que não tem condições de arcar sozinho com a responsabilidade constitucional de levar serviços de Saúde a toda a população, a parceria com entidades privadas nessa área não é uma questão pacífica. Há na administração pública fortes restrições, tanto de natureza ideológica quanto ditadas pelo fisiologismo, que obstruem o caminho para o entendimento de que é imperioso o ente governamental unir esforços com a iniciativa privada sem fins lucrativos para transpor o enorme abismo ainda existente no Brasil entre a Saúde que é um direito da cidadania e a Saúde que é oferecida à população, especialmente a mais carente.
Os fisiológicos alojados nas instituições governamentais, ávidos por tirar vantagens pessoais do serviço público, fazem tudo para impedir que a parceria com instituições privadas diminua seu poder, restrinja seu campo de ação. Para os "ideológicos", a solução de todos os problemas sociais está na presença ubíqua do Estado, razão pela qual a parceria em serviços essenciais, que preferem chamar de "terceirização", significa uma distorção inadmissível de seu ideário retrógrado.
Argumentam os sectários do estatismo que abrir o campo da Saúde equivale a deixar a raposa tomar conta do galinheiro. Ora, a parceria com as instituições do Terceiro Setor é regulada por contratos de gestão ou convênios, por meio dos quais o poder público pode e deve estabelecer garantias para preservar o interesse público e coibir a prática de ilicitudes. Se estas, apesar de tudo, ocorrem, é porque os malfeitores privados se acumpliciam com malfeitores públicos. Ou vice-versa. Mas aí já é caso de polícia.
O argumento mais forte em defesa das parcerias para o cumprimento da missão do SUS, de todo modo, é o fato de que o poder público não tem, comprovadamente, condições de cobrir com recursos humanos e técnicos próprios toda a demanda por serviços de saúde. A cidade de São Paulo é um bom exemplo: cerca de 60% do serviço de atenção à saúde no Município é prestado por entidades privadas contratadas ou conveniadas com a Prefeitura.
Mas isso não é suficiente para conquistar a boa vontade de quadros partidários que, por "razões ideológicas", concedem apenas considerar essas parcerias um "mal necessário". O resultado é que acabam se criando, intencionalmente ou não, dificuldades para a execução das operações contratadas ou conveniadas. E isso se reflete negativamente no atendimento ao usuário do SUS.
Um exemplo que ilustra com cores fortes o preconceito e a falta da devida consideração em relação às parcerias foi a realização, no mês passado, em Ubatuba, do XXVIII Congresso de Secretários Municipais de Saúde do Estado de São Paulo. Para compor as mesas de abertura e de encerramento do congresso, bem como os quadros de palestrantes e debatedores da dúzia de temas constantes da programação do evento, não foi lembrado o nome de um único representante dos parceiros privados que ajudam as prefeituras a tocar o SUS.
E a Carta de Ubatuba, que consubstanciou em 27 itens os "Compromissos & Propostas" do evento, não dedica uma linha, nem faz a menor referência às parcerias, como se as secretarias municipais se desincumbissem sozinhas de tocar o SUS. É uma omissão que afirma um estatismo que dá as costas para a Constituição, à lei ordinária e à política que a presidente da República diz seguir.
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