
28 de abril de 2011 | 00h00
Desmoralizado pelo hábito de não levar adiante nenhuma investigação sobre denúncias de quebra de decoro por parte dos senadores, o Conselho de Ética estava desativado havia cerca de dois anos, quando a bancada oposicionista renunciou coletivamente em protesto contra o arquivamento de todos os processos relativos ao "escândalo dos atos secretos" que envolviam José Sarney. Integrado por 15 titulares e 15 suplentes, o Conselho foi finalmente reconstituído esta semana, com uma escalação cuidadosamente planejada pela dupla Sarney-Calheiros para que continue fazendo exatamente o mesmo: arquivar os processos que contrariem seus interesses. Essa é a razão pela qual o renovado Conselho de Ética e Decoro Parlamentar do Senado é deliberadamente integrado por muitos parlamentares acusados de infringir os mais elementares princípios da ética e do decoro. Vários deles estão sob investigação judicial.
Para a presidência do Conselho foi designado um amigo do peito de Sarney, seu conterrâneo e correligionário João Alberto, que já ocupou o cargo por duas vezes com exemplar coerência: arquivou todos os processos que lhe chegaram às mãos. Mas nem por isso se constrangeu agora ao afirmar que agirá com "independência". E choramingou: "Estar no Conselho é cortar na nossa própria carne".
Para a vice-presidência, foi escolhido a dedo o senador Gim Argello, do PTB do Distrito Federal, aquele que se viu obrigado a renunciar à presidência da Comissão Mista de Orçamento depois que o Estado revelou como ele manipulava verbas parlamentares em benefício de "laranjas". Argello é investigado em inquérito que tramita no STF por ter alugado computadores por valor superfaturado quando era deputado distrital em Brasília. Finalmente, Renan Calheiros escalou a si próprio como membro permanente do colegiado.
Se dependesse exclusivamente da vontade dos próprios senadores, o Conselho de Ética nem existiria. Integrá-lo é considerado um enorme ônus político. Compreende-se. Para cumprir à risca a missão moralizadora do Conselho, o espírito corporativo teria que ser frontalmente contrariado. E não é para isso que muitos estão lá. Resultado: cansados de tentar em vão indicar membros de suas bancadas para integrar o grupo, vários líderes tiveram que escalar a si próprios para a dolorosa missão. Dos 15 membros titulares, 6 são líderes de bancada. "Foi por exclusão, ninguém queria de jeito nenhum e eu tive de assumir", admitiu o líder do PT, Humberto Costa. E até o líder do governo, Romero Jucá, teve que se conformar: "Isso é coisa do Renan. Como ninguém quer, acabou sobrando para mim". Diante de tão sinceras e eloquentes demonstrações de desapreço pelo trabalho do Conselho de Ética e Decoro Parlamentar, o que se pode esperar?
Para o senador Jarbas Vasconcellos, dissidente da base de apoio parlamentar do governo no Congresso, a composição do Conselho é um desestímulo à apresentação de denúncias a serem investigadas: "Quem vai mandar alguma coisa para um conselho cheio de pessoas amigas do presidente da Casa?".
De fato, o retrospecto e as perspectivas não são nada animadores.
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