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Evitar a sucata tecnológica

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Por Redação
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Com uma portaria de apenas dois artigos, o governo removeu um dos maiores obstáculos à importação de máquinas usadas. Assinada no dia 19 pelo ministro do Desenvolvimento, Miguel Jorge, a portaria acaba com a exigência da apresentação de atestados de inexistência de produção nacional similar acompanhados de laudo técnico do material a ser importado. A exigência do laudo encarecia e retardava a importação, quando não a inviabilizava. Com a medida, o governo atende a reivindicações de boa parte do setor produtivo, que tem interesse em importar equipamentos usados. Até agora, como reconheceu o secretário do Comércio Exterior do Ministério do Desenvolvimento, Welber Barral, o governo exercia "um controle muito grande sobre o que se compra lá fora, o que prejudicava diversos segmentos industriais". A portaria reduz esse controle. Desde 1991, a importação de equipamentos usados só era autorizada pelo governo se os pedidos estivessem acompanhados de "laudo de vistoria do material a importar, firmado por entidade especializada, de reconhecida capacidade técnica". O laudo deveria conter, entre outras especificações, o ano de fabricação do equipamento a ser importado; o ano de reconstrução ou recondicionamento, com a indicação das peças substituídas; uma declaração de que as condições operacionais continuavam idênticas às de uma máquina nova análoga; e as diferenças tecnológicas entre o modelo examinado e a unidade mais moderna do gênero. Essas exigências propiciaram o florescimento de uma lucrativa atividade de emissão de laudos, que custavam de R$ 3 mil a R$ 10 mil cada um, segundo o governo, o que encarecia o equipamento, gerava incertezas sobre a importação e atrasava o processo. Eram anacrônicas. Chegou a ser anunciada uma versão mais abrangente da portaria, que facilitaria imediatamente a importação de peças e componentes usados para a manutenção de máquinas e equipamentos, como parte do plano do governo de facilitar a compra no exterior de bens usados. Essa versão seria igual à do projeto de portaria que a Secretaria de Comércio Exterior (Secex) publicou em dezembro, para receber sugestões dos interessados. Esse projeto, de fato, permitia o licenciamento da importação de partes, componentes, peças, acessórios e sobressalentes recuperados e não produzidos no País. Entre outras mudanças, o projeto reduzia de 30 para 15 dias o prazo para comprovação da existência similar nacional, o que provocou forte reação de parte da indústria. Com a concordância da Federação das Indústrias do Estado de São Paulo, o Ministério do Desenvolvimento realizará uma consulta pública em abril para aperfeiçoar o projeto. O governo pretende publicar até julho a nova portaria, mais abrangente do que a publicada no dia 23. Esta não inclui peças e componentes usados entre os itens cuja importação não precisa de laudo técnico. A portaria manteve as demais condições que vigoram desde 1991 para a importação de bens usados, entre as quais a de que não haja similar nacional e o prazo de 30 dias para a comprovação, se for o caso, de que o bem é fabricado no País. Continua proibida a importação de bens de consumo usados. Mesmo assim, a portaria já em vigor foi criticada por algumas entidades empresariais, entre as quais a Associação Brasileira da Indústria Elétrica e Eletrônica (Abinee). A Abinee reconhece que "as análises sobre os pleitos para importação de bens usados devem ser agilizadas, para que uma burocracia exagerada não impeça a importação de equipamentos usados sem similar nacional e em comprovadas condições de operação", mas observa que isso não pode ser feito "em prejuízo do parque produtivo instalado no Brasil, cujas indústrias geram emprego, renda e arrecadam tributos ao erário". Entidades sindicais apoiam essa posição. Mas, se não há similar fabricado no País, é difícil entender como a medida afeta o emprego e a arrecadação tributária. Uma preocupação da indústria que precisa ser levada em conta é a de que, sem a exigência de laudos técnicos sobre as condições operacionais do equipamento usado a ser importado, o País pode tornar-se importador de "sucata tecnológica".