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Explosão de litigiosidade

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Por Redação
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A sociedade brasileira está litigando cada vez mais. Em 1990, as Justiças Estaduais, Federal e Trabalhista receberam 5,1 milhões de novas ações. Em 2006, foram 22 milhões. Em 2008, foram ajuizados 25,5 milhões de novos processos. Somando-se essas ações com as que foram protocoladas nos anos anteriores e ainda aguardavam julgamento, 2009 começou com 86,6 milhões de ações em tramitação nos três ramos da Justiça. Os números constam do último balanço do Conselho Nacional de Justiça (CNJ) e as estimativas são de que, no ano passado, a demanda da primeira instância dos tribunais tenha batido mais um recorde. Segundo os especialistas, o Poder Judiciário somente não entrou em colapso por causa dos avanços propiciados pela entrada em vigor da súmula vinculante, do princípio da repercussão geral e da cláusula impeditiva de recursos. Introduzidos pela Emenda Constitucional n.º 45, que entrou em vigor há seis anos, esses três mecanismos processuais foram concebidos para agilizar o julgamento dos chamados litígios de massa. A ideia era possibilitar que, com o estabelecimento de súmulas e a ampliação da jurisprudência, os processos mais corriqueiros pudessem ser encerrados em curto prazo de tempo na primeira instância, sem subir para as instâncias superiores. Isso ajudou a reduzir o volume dessas cortes e do Tribunal Superior do Trabalho (TST), do Superior Tribunal de Justiça (STJ) e do Supremo Tribunal Federal (STF). Mas, por causa da crescente litigiosidade da sociedade, o congestionamento da base do Judiciário continuou aumentando. Até os Juizados Especiais, que foram criados para julgar com rito sumário as causas de pequeno valor, no âmbito cível, e os delitos de baixo potencial ofensivo, no âmbito criminal, estão abarrotados. As ações levadas aos Juizados Federais e Estaduais deveriam ser encerradas em poucos meses, mas hoje demoram mais de um ano para ser julgadas. Na Justiça comum, a situação é mais crítica na fase de execução. Nas varas federais, por exemplo, só 20% do total de processos tramitam nos prazos previstos. Já nas varas estaduais, esse número cai para 10%. A maior demanda recai sobre as Justiças Estaduais. Esses tribunais receberam 18,7 milhões dos 25,5 milhões de novos processos ajuizados em 2008. Segundo o Conselho Nacional de Justiça, a média foi de 1.613 processos por 100 mil habitantes, na Justiça Federal; de 1.422, na Justiça do Trabalho; e de 8.944, nas Justiças Estaduais.O extraordinário aumento da litigiosidade decorre de pelo menos três fatores. O primeiro é a insegurança jurídica decorrente da proliferação desenfreada de leis, o que prejudica cidadãos e empresas. Pelas estatísticas do Senado, em 1978, o País tinha 66 mil textos legais - entre emendas constitucionais e leis delegadas, complementares e ordinárias. Em 2006, esse número subiu para cerca de 141 mil. E chegou a 150.425, em março deste ano. O balanço não inclui as leis estaduais e municipais.O segundo fator responsável pelo aumento da litigiosidade é o sucesso do Código de Defesa do Consumidor, que acaba de completar 20 anos de vigência. Ele levou à criação de Procons em todas as unidades da Federação e isso coincidiu com o período da privatização dos serviços essenciais e de concentração do setor bancário e das lojas de departamentos. Com isso, aumentaram as reclamações de cidadãos e empresas contra as instituições financeiras, os supermercados e as empresas privadas que assumiram serviços antes prestados por autarquias e empresas estatais. O terceiro fator está associado ao aumento real do salário mínimo e aos programas de transferência de renda. Segundo a Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílio (Pnad), divulgada pelo IBGE na semana passada, isso levou ao ingresso de 32 milhões de novos consumidores - e de potenciais litigantes - no mercado de consumo, entre 2003 e 2008. E, por tabela, aumentou a procura pelos tribunais, especialmente no âmbito das Justiças Estaduais. Em algumas delas, segundo o balanço do Conselho Nacional de Justiça, o número de novas causas dobrou no período de apenas um ano.