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Falta o roteiro do crescimento

Qualquer resultado positivo dependerá de condições politicamente complicadas

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Por Redação
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Otimismo de verdade, nesta altura, é prever crescimento econômico de 3%, ou até mais, em 2019, primeiro ano do mandato do presidente recém-eleito. Se isso se confirmar, o Brasil ainda correrá bem atrás de muitos países emergentes, mas haverá algum motivo para celebração. O avanço do País será mais que o dobro do previsto para este ano. Isso poderá resultar em desemprego pouco menor e, como consequência, em um pouco de bem-estar para centenas de milhares de famílias. Com otimismo mais moderado, outros economistas apostam numa expansão entre 2% e 2,5%. Será um desempenho modesto, mas bem superior ao observado desde o fim da recessão. Qualquer resultado positivo dependerá de condições politicamente complicadas - tanto mais complicadas quanto mais ambiciosa a meta.

Para tornar real o cenário mais otimista, o novo presidente deverá conseguir a aprovação de uma boa reforma da Previdência e, além disso, avançar com segurança no controle da dívida pública. Ganhos mais modestos - e mais prováveis - no programa de ajustes e reformas deverão proporcionar ganhos econômicos mais moderados, embora num quadro melhor que o deste ano.

O presidente eleito e sua equipe deveriam dar atenção a um detalhe muito relevante: há algum otimismo também nas estimativas de crescimento próximas de 2,5%. Nenhum progresso relevante será obtido de graça ou apenas como efeito da vitória eleitoral.

A pesquisa Focus, atualizada a cada semana pelo Banco Central (BC), é uma referência preciosa. A mediana das projeções de crescimento nos próximos três anos tem-se mantido em 2,50% há semanas. Para muitos economistas, esse é o potencial de expansão da economia brasileira. Mas, para utilizar esse potencial, a economia necessita de certas condições, a começar pela arrumação das contas públicas. Analistas entrevistados pelo Estado já afirmaram mais de uma vez esse pressuposto.

A tarefa seria muito mais simples se os desafios fossem apenas técnicos. As questões técnicas são consideráveis, mas bons estudos estão disponíveis para avaliação do governo. Os obstáculos mais temíveis são políticos. A vitória eleitoral e a renovação parcial do Congresso de nenhum modo asseguram o apoio necessário à aprovação de uma boa reforma da Previdência ou de outras mudanças. Será preciso mexer no sistema tributário, na estrutura do Orçamento, nas normas da administração federal e assim por diante.

Haverá oposição, em alguns casos muito forte, a todas essas mudanças. Parte importante da resistência virá de um funcionalismo com grandes interesses corporativos e poderosamente representado no Parlamento.

Avançar nos ajustes e reformas deverá criar a confiança necessária para destravar negócios, estimular investimentos e encorajar contratações de pessoal. Isso poderá dinamizar a economia no próximo ano, mas o crescimento duradouro e mais forte dependerá de condições adicionais. A expansão inicial do investimento privado será importante, mas será preciso algo mais para elevar o potencial produtivo e permitir crescimento superior a 3% por um longo período.

Também o investimento nas empresas terá pouco espaço para avançar, se os projetos de expansão e renovação da infraestrutura continuarem travados. Sem o progresso nas duas frentes, a produtividade geral da economia brasileira continuará deprimida. Não haverá como diminuir a distância entre o Brasil e os países emergentes mais bem administrados.

O governo terá de mostrar competência na mobilização de capitais privados para setores como os de logística, energia e saneamento. Ao mesmo tempo, precisará conduzir com bom senso o prometido programa de privatizações. Esse programa, segundo o presidente eleito, dependerá de avaliações estratégicas. Mas estratégia, quando se trata de economia, envolve noções de planejamento, muito diferentes do mero palavrório ideológico. Falta esclarecer pontos essenciais do roteiro econômico.