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Freio à farra dos convênios

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Por Redação
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Na mesma segunda-feira em que a transmissão do cargo no Ministério do Esporte se converteu em ato de desagravo ao titular afastado, Orlando Silva - a quem a presidente Dilma Rousseff louvou pelo "excepcional trabalho" e que o substituto Aldo Rebelo considerou "mais do que inocente, uma vítima" -, entrou em vigor o decreto destinado a moralizar os negócios da administração federal com entidades privadas sem fins lucrativos, a começar das organizações não governamentais (ONGs). Desde que, em 2003, o PC do B de Orlando Silva e Aldo Rebelo foi premiado pelo então presidente Lula com o Ministério do Esporte, pelo menos 41 ONGs ligadas à legenda receberam recursos públicos para a execução de programas da pasta. O grosso do dinheiro ou foi desviado pelos controladores das ONGs de fachada ou, a julgar pelas denúncias que derrubaram Orlando Silva, carreado para o caixa 2 do "partido do socialismo". Revelação similar de corrupção já havia apeado o ministro do Turismo, Pedro Novais, do PMDB.O decreto da presidente tem uma dimensão emergencial e outra estrutural. A primeira está na suspensão de 2.670 convênios com entidades sem fins lucrativos, que somam R$ 2,3 bilhões. Durante 30 dias esses contratos serão submetidos a um pente-fino por uma força-tarefa do Executivo. Os que estiverem em ordem voltarão a receber verbas. Nos demais casos, as entidades terão 60 dias para sanar as irregularidades. Se não o fizerem, deverão devolver os valores obtidos e entrarão para a lista negra das organizações às quais o poder público não poderá mais se associar. Além de fechar a torneira dos gastos que iam para o ralo, a intenção do governo é separar as ONGs "sérias e qualificadas" das entidades "fantasmas", nas palavras do ministro da Controladoria-Geral da União (CGU), Jorge Hage, que participou da elaboração do decreto. O censo mais recente das ONGs brasileiras, em sentido amplo, data de 2005: eram 338 mil fundações e entes sem fins lucrativos, empregando 1,7 milhão de pessoas.No plano estrutural, o ponto talvez mais importante do decreto é o que restringe a "ministros de Estado e dirigentes máximos das entidades da administração pública federal" a faculdade de assinar convênios nas suas áreas. Eles também arcarão com a responsabilidade direta pela gestão e o controle das parcerias que decidiram firmar. De agora em diante, portanto, quando se descobrir irregularidades em convênios, nenhum ministro poderá imitar o ex do Esporte, Orlando Silva, que se eximiu de culpa sob a alegação, verdadeira, de que não fora ele o signatário dos contratos que explodiram na sua face, mas subordinados seus. A responsabilização dos titulares começa já agora: eles é que terão de dizer quais dos convênios suspensos podem ser reativados e quais devem ser objeto do processo administrativo chamado "tomada de contas especial", na CGU. O órgão, por sua vez, deverá cadastrar as ONGs e assemelhadas impedidas de receber recursos federais. O decreto desta semana complementa e amplia o que a presidente baixou em setembro, com a mesma intenção moralizadora.Daquela vez, Dilma instituiu a chamada pública de entidades para fins de contratação mediante convênios. Com isso, as autoridades de turno perdem a prerrogativa de contratar, por exemplo, quem lhes der na veneta. Além disso, para se qualificar a um convênio, a entidade terá de comprovar que, nos três anos precedentes, exerceu atividades relacionadas com a área de interesse da parceria. Será um tiro nas ONGs de cartolina, registradas apenas para se apropriar do dinheiro do contribuinte, com seus cúmplices na máquina do governo. Por fim, organizações que deixaram de prestar contas de contratos ou cometeram irregularidades na sua execução não terão uma segunda chance. Essas medidas, noticiou o jornal Valor, fazem parte de um pacote de propostas da CPI das ONGs, que funcionou no Senado de 2007 a 2010. Segundo o seu presidente, o ex-senador Heráclito Fortes, do DEM, o relatório final não chegou a ser votado, porque "o governo pressionou, sentou em cima e não permitiu apurar nada".