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Gastos abusivos na Justiça

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Por Redação
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Uma semana depois de determinar a aposentadoria compulsória - pena disciplinar máxima prevista pela legislação - de um magistrado da Justiça estadual alagoana envolvido em esquema de corrupção, o Conselho Nacional de Justiça (CNJ) decidiu enfrentar outro grave problema no âmbito do Poder Judiciário. Trata-se do excessivo número de viagens realizadas por juízes e da concessão abusiva de diárias, acrescidas do pagamento de horas extras. Encarregado de promover o controle externo do Judiciário, o CNJ plotou o problema nas inspeções que vem fazendo nas Justiças estaduais, especialmente na Região Nordeste, e baixou resolução disciplinando a matéria. Os maiores abusos foram descobertos nos Tribunais de Justiça da Paraíba, onde um desembargador se tornou réu de ação penal, acusado de ordenar o pagamento de despesas não autorizadas em lei, e do Maranhão, cujos magistrados recebem diárias superiores as dos ministros do Supremo Tribunal Federal (STF), quando viajam para fora de sua comarca ou do Estado. "Isto nos parece impróprio, uma distorção", diz João Oreste Dalazen, ministro do Tribunal Superior do Trabalho e membro do CNJ. Nas duas Cortes, segundo o CNJ, viagens e diárias custeadas com dinheiro público foram convertidas em "complemento salarial". No Tribunal de Justiça da Paraíba, por exemplo, as diárias para locomoções dentro do Estado vão de R$ 328,05, no caso de juízes substitutos, a R$ 500, no caso de desembargadores. Para fora do Estado, elas têm um acréscimo de 50%, chegando a 70% para os ocupantes de cargos de direção do tribunal. No Tribunal de Justiça do Maranhão, as diárias são de R$ 1 mil, enquanto no STF elas não ultrapassam R$ 614. Além da concessão abusiva de diárias, os magistrados paraibanos e maranhenses viajam pelo País e para o exterior para participar de atividades que não atendem aos interesses da administração pública. Segundo o CNJ, muitas viagens são absolutamente desnecessárias, tendo como justificativa comparecimento a homenagens e entrega de medalhas. Há, também, viagens que, autorizadas sob o pretexto de comparecimento a seminários, não passam de meras excursões a cidades turísticas e centros de lazer. E entre os acompanhantes dos desembargadores, todos com as despesas pagas pelo Judiciário, estão cônjuges, pais e filhos, além de assessores. No caso do Tribunal de Justiça da Paraíba, segundo o CNJ, só a mulher do desembargador Marco Antonio Souto Maior, que presidiu a Corte entre 2001 e 2002, teria realizado 34 viagens no período, sob a justificativa da necessidade de "acompanhar o marido". Acusado de crime de peculato, Souto Maior é réu em ação penal que tramita no Superior Tribunal de Justiça (STJ). Seus advogados alegam que a mulher e seus filhos eram funcionários da Corte, na época, e tiveram de viajar para "cumprir agenda oficial". O desembargador também é acusado de ter autorizado o Tribunal de Justiça da Paraíba a pagar R$ 8,4 mil em diárias a seu filho para comparecer, entre outros eventos, a uma exposição de arte na Espanha. Em 2002, segundo o CNJ, Souto Maior teria autorizado, sem previsão orçamentária, gastos de R$ 195 mil somente para pagamento de viagens e diárias. Ele também promoveu duas exposições de arte no tribunal, tendo pago passagens de participantes e transferido R$ 19 mil em recursos públicos para a Associação de Esposas de Magistrados da Paraíba. Os advogados do desembargador alegam que as acusações contra ele são "mera conjectura" e que as duas exposições foram "relevantes para a sociedade paraibana". Preocupada com a desmoralização do Poder Judiciário, a Associação dos Magistrados Brasileiros há muito tempo reivindicava a regulamentação do pagamento de diárias de viagens a juízes, assessores e familiares. Pela resolução que o CNJ acaba de baixar, nenhum juiz poderá receber diárias superiores às dos ministros do STF, as viagens deverão ser previamente justificadas, com publicação no Diário Oficial, e os gastos cobertos com o valor das diárias terão de ser comprovados. A determinação do CNJ deve servir de exemplo para a Câmara dos Deputados e para o Senado, mergulhados na "farra das passagens".