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Generosidade dos deputados

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Por Redação
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Com mais uma ampliação, aprovada pela Câmara dos Deputados, da lista dos setores que serão beneficiados por incentivos fiscais concedidos pelo governo dentro do Plano Brasil Maior - lançado em agosto do ano passado, como tentativa de reduzir o impacto da crise mundial sobre a atividade econômica no País, e ampliado pela primeira vez em abril, com a inclusão de novos setores a serem favorecidos -, o que, por sua inconsistência, era apenas um arremedo de política industrial tornou-se um texto desconexo.Num esforço de véspera de recesso parlamentar, notoriamente estimulado pelo compromisso do governo de liberar dinheiro para as emendas de iniciativa dos deputados, a Câmara aprovou as duas medidas provisórias que estendem os benefícios do Brasil Maior. Mas o fez à sua moda, aumentando a lista dos setores escolhidos para ganhar os benefícios e deixando pior o que já não era bom.Para conseguir aprovar na Câmara as Medidas Provisórias (MPs) 563 e 564 a tempo de elas poderem ser examinadas e votadas pelo Senado antes que caducassem, o governo teve de vencer a resistência da oposição, que vinha utilizando diversos mecanismos regimentais para impedir a votação. Além de descontente com o ritmo de liberação das emendas parlamentares, a oposição criticava o fato de o governo ter escolhido determinados setores para se beneficiar de medidas tributárias pontuais, em vez de adotar uma política industrial articulada e consistente.O governo teve de se comprometer a abrir os cofres, liberando as emendas parlamentares, numa barganha que o presidente da Casa, deputado Marco Maia (PT-RS) - considerado fiador dos entendimentos -, chamou eufemisticamente de "um bom acordo". O governo deve estar contando com novo "bom acordo" no Senado para que os projetos de conversão das MPs sejam aprovados até o dia 15 de agosto, em pleno "recesso branco" da Casa, em razão do envolvimento dos senadores nas campanhas eleitorais em suas bases.A crítica da oposição às MPs, que qualificou de providências apenas pontuais, resume a deficiência mais gritante do Plano Brasil Maior. Na essência, esse plano, anunciado como o início de uma política industrial, inclui medidas de apoio a setores escolhidos da economia, providência já colocada em prática em outras ocasiões, com resultados discutíveis. É fundamentalmente um conjunto de ações defensivas, destinadas a impedir que a atividade econômica se reduza ainda mais.Não há, nele, planos ou propostas voltados para tornar o setor produtivo nacional mais competitivo, para que possa enfrentar os produtos importados em melhores condições e, ao mesmo tempo, conquistar mais espaços no mercado mundial. Isso implica redução estrutural - e não apenas temporária - de custos operacionais, o que implica mudanças no sistema tributário, a melhora substancial da infraestrutura, o apoio efetivo à pesquisa, ao desenvolvimento e à inovação. Elaborar um plano como esse exige disposição, organização e competência, entre outros requisitos que o governo Dilma ainda não demonstrou possuir.Sem isso, as medidas para enfrentar a crise resumem-se a apoios a alguns setores. Originalmente, as MPs 563 e 564 estendiam os benefícios do Plano Brasil Maior. A primeira MP acrescentava à lista original os setores de hotéis, móveis, autopeças, naval, aéreo, empresas de call center e fabricantes de chips. A Câmara incluiu na lista empresas de transportes, fabricantes de brinquedos, fornecedores de pedras e parte do agronegócio. A MP chegou à Câmara com 54 artigos e de lá saiu com 78.A segunda MP autoriza a União a injetar mais R$ 45 bilhões no BNDES e amplia a lista dos setores beneficiados pelo programa criado no BNDES para apoiar empresas mais afetadas pela crise mundial.Como o secretário executivo do Ministério da Fazenda, Nelson Barbosa, acompanhou as negociações das mudanças nas MPs, os deputados acreditam que o governo concorda com elas. Não há, porém, garantia de que, se o texto for aprovado também pelo Senado, seja sancionado pelo Executivo sem vetos.