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Greves eleiçoeiras

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Por Redação
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Como ocorre em todos os anos eleitorais, algumas corporações do funcionalismo público tentam aproveitar a ocasião para obter aumentos salariais e vantagens funcionais. A estratégia é sempre a mesma - suspender serviços essenciais, criar situações de fato, converter a população em refém de interesses corporativos e constranger governantes para que acatem, sob pressão, reivindicações que podem até ser irrealistas ou absurdas. Esse tipo de oportunismo pode ser visto tanto no Poder Executivo quanto no Poder Judiciário. Na última quarta-feira, por exemplo, escrivães, papiloscopistas e agentes da Polícia Federal (PF) - cujos salários vão de R$ 7.514,33 a R$ 11.879,08 - fizeram uma greve relâmpago de 24 horas e promoveram operações-padrão nos principais aeroportos do País. A justificativa foi pressionar o governo a promover uma "reestruturação da carreira" e o Congresso a aprovar uma lei orgânica para a PF. Os grevistas alegam que tiveram aumentos de "apenas" 83,3%, durante os dois mandatos do presidente Lula, enquanto outras carreiras do Poder Executivo foram agraciadas com reajustes salariais que variaram de 140% a 552,8%. Manifestações semelhantes também estão ocorrendo nas Justiças Federal e do Trabalho, o que obrigou as corregedorias judiciais a exigir que os grevistas mantenham em funcionamento a distribuição e o protocolo dos processos, as centrais de mandados para casos urgentes e os serviços de expedição de alvarás, desbloqueio de contas correntes, atendimento de liminares e tutela antecipada e de protocolo de petições urgentes e emissões de certidões. Os corregedores lembram que, há três anos, o Supremo Tribunal Federal (STF) firmou jurisprudência reconhecendo o direito de greve dos servidores públicos, mas com a condição de que os chamados serviços de "cunho social" - como assistência médico-hospitalar, transporte coletivo, tratamento de esgoto e controle do tráfego aéreo - não sejam interrompidos. Na ocasião, a Corte também decidiu que, enquanto o Congresso não aprovar uma lei complementar que regulamente a greve na administração direta, como prevê o inciso VII do artigo 37 da Constituição, as paralisias do funcionalismo público serão regidas pela Lei n.º 7.783/89, que disciplina a greve na iniciativa privada. A ameaça de greve mais irresponsável, feita na semana passada, a menos de cinco meses das eleições para o preenchimento de cargos federais e estaduais, partiu dos servidores da Justiça Eleitoral. Além de reajustes salariais, eles reivindicam a imediata aprovação, pelo Legislativo, de um novo plano de carreiras no âmbito do Poder Judiciário. Os servidores da instituição alegam que os salários iniciais estão abaixo do vencimento básico de carreiras dos outros Poderes. O projeto foi enviado para o Congresso há cinco meses e o ministro do Planejamento, Paulo Bernardo, já deixou claro que a União não dispõe de recursos para arcar com os aumentos salariais por ele previstos e que não cederá a pressões corporativas do funcionalismo dos Três Poderes. A ameaça de greve pegou de surpresa o presidente do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), ministro Ricardo Lewandowski, que assumiu o cargo há um mês. Segundo ele, a paralisia dos servidores judiciais seria flagrantemente ilegal e poderia comprometer a campanha eleitoral. "A Justiça eleitoral é um serviço essencialíssimo. Se houver greve, os grevistas vão punir a cidadania, não o Poder Judiciário", disse ele, depois de lembrar que não admitirá "nenhum prejuízo" às eleições de outubro. Algumas das categorias que estão tentando aproveitar as eleições para deflagrar greves são corporações de Estado. Ou seja, são servidores que, além de já receberem um tratamento salarial e funcional diferenciado, atuam em áreas estratégicas cujas atividades não podem ser suspensas sob qualquer pretexto. Isso foi lembrado de modo exemplar na semana passada pelo Superior Tribunal de Justiça, quando ordenou aos servidores do Ibama o imediato retorno ao trabalho, determinou o desconto dos dias parados e fixou uma multa de R$ 100 mil, caso descumprissem a decisão.