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HC, 65 anos de pioneirismo

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Por José Manoel de Camargo Teixeira
3 min de leitura

Quando abriu suas primeiras portas, em abril de 1944, o Hospital das Clínicas (HC) de São Paulo, ligado à Secretaria de Estado da Saúde, tinha como principais metas o atendimento de excelência à população menos favorecida, o ensino universitário e o desenvolvimento de pesquisas científicas. Passados 65 anos de história, sem descuidar dessas três frentes em nenhum momento da trajetória, o HC/FMUSP acabou desenvolvendo outra marcante característica: a de hospital pioneiro. Com essas acentuadas particularidades, o HC tem-se mantido sempre à frente no atendimento de excelência aos pacientes do Sistema Único de Saúde (SUS), desafiando o passar dos anos e as novas exigências sociais. Seu maior mérito para evoluir ao longo das últimas décadas talvez tenha sido o de transformar pesquisas científicas em pesquisas aplicadas, tanto no que se refere às inovações no tratamento de doenças como no aperfeiçoamento de aparelhos e equipamentos. Nos dias atuais, a preocupação em avançar não amainou. Ao contrário. Para nos mantermos alinhados em posição de igualdade com os melhores hospitais do mundo, a orientação que passo, incessantemente, aos 15 mil funcionários do complexo é a de que não nos podemos satisfazer com o posto alcançado. Quando se trata de atendimento à saúde, é imprescindível buscar inovações e fazer ajustes. Se no passado nos destacamos por realizar o primeiro transplante de rim da América Latina, o primeiro transplante intervivos de fígado do mundo, e por instalar o primeiro centro de ressonância magnética em hospital público no Brasil, hoje estamos na vanguarda no que se refere ao combate ao câncer. Estamos instalando um aparelho Ciclotron, capaz de produzir radiofármacos que diagnosticam tumores em fase bastante inicial, facilitando o tratamento e a cura dos pacientes. Até meados de maio seremos o único hospital público do País a ter essa tecnologia. Ainda com relação à vocação para o pioneirismo, o HC adquiriu, neste mês, um equipamento de ressonância magnética que funcionará junto ao centro cirúrgico do Instituto de Psiquiatria. Somente os principais hospitais do mundo possuem essa máquina, que produz imagens precisas do cérebro do paciente, mesmo durante a realização de procedimentos cirúrgicos. No que se refere às novidades de gerenciamento, desenvolvemos recentemente um programa chamado HC 20 +, para ampliar a gestão do conhecimento no complexo. A ideia é fazer o hospital utilizar toda a experiência acumulada nas últimas décadas para "pensar" sobre cada passo a ser dado, do dia atual até os próximos 20 anos, buscando mecanismos de inteligência organizacional. É a primeira vez, no Brasil, que esse tipo de gestão é trazido para dentro de um órgão público. Trata-se de uma importante revolução, sobretudo na área da saúde, pois com esse programa teremos um diagnóstico continuado, que facilitará tanto o desenvolvimento de diretrizes como a administração de resultados e o alcance de melhorias técnicas. Outra novidade a ser destacada é a cada vez maior inserção do Hospital das Clínicas na rede pública de saúde. Recentemente, a Prefeitura de São Paulo estabeleceu parceria com a Faculdade de Medicina da USP (FMUSP) - contando com a atuação do HC - pela qual seremos responsáveis por todo o atendimento de saúde da zona oeste da capital, desde os procedimentos básicos até os casos mais complexos. Trata-se de mais um grande passo dado pela instituição, que levará suas equipes especializadas para além dos muros do HC, chegando aos bairros e beneficiando cerca de 2,3 milhões de moradores da região oeste. Seguindo as diretrizes da Secretaria de Estado da Saúde, o HC também vem intensificando o trabalho de humanização no atendimento. Temos promovido inúmeras mudanças estruturais e de gerenciamento para que as pessoas que cheguem ao complexo não sejam somente tratadas e curadas, mas, sobretudo, acolhidas e respeitadas rigorosamente em todas as fases do atendimento. Esses inúmeros avanços são fruto de um importante processo de amadurecimento. Se, por um lado, a energia da juventude estará sempre presente no HC, graças aos nossos universitários, por outro, a maturidade adquirida nas últimas décadas também tem sido fundamental para o nosso desenvolvimento. Aprendemos, por exemplo, que não podemos deixar de investir em equipamentos modernos, mas ao mesmo tempo entendemos e comprovamos que aparelhos jamais substituirão o contato humano. É comum relacionarem a excelência do trabalho do HC à riqueza dos institutos - todos com tecnologia de última geração. Entretanto, acredito que o nosso maior patrimônio não sejam as máquinas, mas a gama de profissionais e professores que atuam por trás de macas, mesas e equipamentos. Graças a eles, em nenhum momento o atendimento personalizado deu ou dará lugar ao atendimento em massa. Esse é o nosso diferencial. Neste mês de abril, o HC comemora 65 anos. É uma data bastante significativa e que certamente será festejada não só pela população paulista, mas por milhares de brasileiros, das mais diversas regiões, que são acolhidos nas dependências da unidade. Isso nos enche de orgulho e dá forças para seguir em frente. Passada a festa, porém, é fundamental não perdermos o foco. Ainda temos muitos desafios pela frente, para os quais estou certo de estarmos bem preparados. Com o vigor de um hospital universitário e a maturidade dos nossos 65 anos, vamos encarar o futuro. Com austeridade, mas não de semblante fechado, e sim com a serenidade com que olhamos para os nossos pacientes. José Manoel de Camargo Teixeira, médico, é superintendente do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da USP