19 de junho de 2012 | 03h08
Senão, vejamos. No final dos anos 90 era simplesmente caótica a situação financeira da maior parte dos Estados e municípios. Como observou em artigo publicado no Estado, no domingo passado, a jornalista Suely Caldas, "quase todos estavam falidos, não conseguiam investir um centavo porque a receita tributária inteira era comprometida com o pagamento de salários. Em alguns casos não dava nem para isso". E relembrou o episódio em que o chefe do Poder Judiciário de Alagoas "foi a Brasília entregar a chave do tribunal porque os juízes não recebiam salários há meses", para concluir: "Era o desfecho de anos a fio de gestões desastradas, irresponsáveis, governadores desviando dinheiro de investimento para financiar campanhas eleitorais. E quando o cofre esvaziava, corriam a Brasília para pedir mais".
De fato, até então imperava no País a mentalidade demagógica e irresponsável de que os governos podem gastar o que for necessário para cumprir promessas e atender a demandas - e também, é claro, para garantir o "por fora" que sustenta legendas partidárias e políticos corruptos - sem levar em conta sua capacidade de endividamento. Os orçamentos públicos eram peças da mais delirante ficção. O próximo governo que se virasse! Em seu segundo mandato, entre as medidas de austeridade adotadas para garantir a estabilidade econômica, o presidente Fernando Henrique enviou ao Congresso Nacional o projeto de Lei Complementar 101, a Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF), destinada a disciplinar os gastos de Estados e municípios, que passaram a ser limitados pela capacidade de geração de receitas de cada um deles. Além disso, a reforma então implantada estabeleceu regras rigorosas para a renegociação das dívidas dos Estados com a União e novas práticas de gestão destinadas a organizar as finanças e recuperar a governabilidade nos três níveis da administração pública. Quinze anos depois, a realidade fiscal do País, apesar de ainda longe do ideal, não mais se compara ao verdadeiro descalabro que imperava na maior parte das administrações estaduais e municipais na virada do século. Estados e municípios recuperaram o crédito.
A aprovação da LRF pelo Congresso, no entanto, foi uma batalha árdua que exigiu toda a capacidade de articulação política do governo contra a feroz oposição liderada pelo PT. A exemplo do que vinham fazendo sistematicamente desde a eleição de Tancredo Neves em 1985 - e disso são exemplos a votação do texto da nova Constituição Federal, em 1988, a votação da Medida Provisória que instituiu o Plano Real em 1994 e todos os projetos destinados, já no governo FHC, a estabilizar a economia -, Lula e seus liderados se posicionaram sempre contra, jamais levando em consideração o interesse nacional, mas apenas sua obsessão pela conquista do poder, que inspirava o discurso demagógico, baseado no confronto com as "elites".
Quando chegou ao poder em 2003, o lulopetismo deixou cair a máscara e passou a zelar pelos fundamentos econômicos "neoliberais", até hoje vigentes, que combatera até a véspera. Em 2010, num seminário comemorativo dos 10 anos da LRF, o ex-ministro da Fazenda Antonio Palocci teve o elogiável bom senso de afirmar que o PT errara ao combater a LRF em 2001. É difícil imaginar outro petista fazendo a mesma autocrítica. Mas o fato é que a festiva solenidade de sexta-feira no Planalto acabou sendo uma homenagem à "herança maldita" de FHC.
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