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Hora de rever o plano de ajuste

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Por Redação
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Consertar as contas do governo, arrasadas nos últimos quatro anos, vai dar muito mais trabalho e consumir mais tempo do que previu a equipe econômica no começo do novo mandato da presidente Dilma Rousseff. Faltando pouco mais de cinco meses para o fim do ano, este é um bom momento para rever os planos e fixar, oficialmente, um objetivo mais modesto para a política fiscal. Uma demonstração de realismo, acompanhada de um sério esforço para chegar a um resultado menos ambicioso, mas alcançável, poderá favorecer, ou no mínimo preservar, a credibilidade da política econômica. Este é o lado bom do projeto de redução da meta de superávit primário, apresentado na quarta-feira passada pelo senador Romero Jucá (PMDB-RR), relator da proposta de Orçamento de 2015. Oficialmente, o governo continua comprometido com a obtenção de um superávit primário – dinheiro para pagamento de juros da dívida pública – de R$ 66,3 bilhões, soma equivalente, segundo se estima, a 1,1% do Produto Interno Bruto (PIB). Falta a divulgação dos números de junho, mas o fechamento das contas do primeiro semestre, como já se sabe extraoficialmente, enterrará qualquer esperança, se ainda houver alguma, de se chegar àquela meta. Essa possibilidade já foi excluída também pelos analistas das agências de classificação de risco. Eles conhecem muito bem o efeito da recessão, do desemprego em alta e da retração do consumo sobre a arrecadação de impostos e contribuições. Além disso, os orçamentos brasileiros são muito rígidos e é complicado, legalmente, cortar a maior parte das despesas correntes. Como os dados principais são conhecidos de todos e as dificuldades são inegáveis, o melhor caminho, para o governo, parece mesmo o jogo aberto e sem subterfúgios com o pessoal das agências. Nada garante um bom entendimento, mas insistir na meta irrealista e fracassar parece o pior caminho.  Antes de apresentar sua proposta, o senador Romero Jucá conversou com os ministros do Planejamento e da Fazenda. Nenhum deles admitiu abertamente um acerto com o senador. Mas tudo indica, e isso é confirmado por informações extraoficiais, um lance ensaiado. Se o projeto for aprovado, a meta de superávit primário em 2015 será reduzida para R$ 22,1 bilhões, ou cerca de 0,4% do PIB. Será bem mais fácil, mas o governo poderá, se quiser, tentar um resultado melhor. A meta de 0,4% seria muito distante, segundo analistas, da necessária para o governo estabilizar e começar a reduzir a proporção entre a dívida pública e o PIB. Mesmo as metas anteriores, mais altas, seriam insuficientes, de acordo com aqueles analistas. Mas o desafio principal, neste momento, é avançar na execução de uma política fiscal mais séria e mais digna de confiança que a dos últimos anos. A mensagem convincente é pelo menos tão importante, nesta fase, quanto o resultado contábil – talvez mais. Mas os problemas criados pela recessão e pelo desemprego são apenas alguns dos obstáculos. Além de ter de iniciar o ajuste com a arrecadação em queda e sem poder cortar certos gastos, o governo deve enfrentar entraves políticos importantes. O aumento salarial de até 78% para servidores do Judiciário e a extensão do reajuste do salário básico às aposentadorias superiores a um mínimo são exemplos de dificuldades criadas no Congresso. Esses desafios vêm sendo impostos tanto pela oposição quanto por partidos governistas. Mesmo petistas têm votado contra a austeridade. Vetar estripulias financeiras aprovadas no Congresso impõe à presidente um custo político adicional. Mas novas dificuldades políticas estão à vista. Proposta de emenda constitucional recém-apresentada pelo Executivo prorroga até 2023 a Desvinculação de Receitas da União (DRU), um expediente para tornar um pouco mais flexível o uso de recursos. A ação do Executivo é fundamental, mas a confiança no País e sua imagem de bom ou mau pagador dependem das condições gerais da política econômica. Isso envolve o Congresso. Há três Poderes, mas, para as agências de classificação de risco, o Estado é um só.