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Levy e a tarefa da reconstrução

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Por Redação
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O ministro da Fazenda, Joaquim Levy, usou a palavra "reconstrução" ao descrever em Nova York a nova etapa de administração da Petrobrás, a gigante estatal corroída durante anos pela corrupção investigada na Operação Lava Jato. Com meio ano de atraso a empresa deve apresentar hoje o balanço do terceiro trimestre de 2014, desta vez com o aval de auditores. Também está prevista a divulgação das contas do quarto trimestre e, portanto, o balanço final do ano. A publicação das demonstrações auditadas "marcará um novo passo na reconstrução da Petrobrás", e isso, acrescentou, acabará com as preocupações dos investidores. A palavra "reconstrução" é forte e clara. Deixa pouca dúvida, talvez nenhuma, sobre como o novo ministro avalia os danos causados pela pilhagem associada ao aparelhamento e ao loteamento de cargos. O público interessado, mais amplo que o grupo dos investidores, tem boa informação sobre os estragos. Raramente uma empresa grande como a Petrobrás, uma das maiores do mundo em sua área de negócios, adia a publicação de suas demonstrações financeiras por falta do aval de auditores internacionalmente reconhecidos.Tanto quanto a investigação e o esforço de revisão das contas, a linguagem e as promessas de Levy podem contribuir para a expectativa de rumos novos e novos padrões da empresa. Levy teria errado, perigosamente, se tivesse tentado negar os problemas ou minimizar sua importância. Teria desvalorizado sua palavra e inutilizado, pelo menos em parte, o esforço para ganhar a boa vontade dos investidores e o apoio de organizações multilaterais relevantes, como o Fundo Monetário Internacional (FMI). Ninguém mudaria de opinião sobre os malfeitos ocorridos no Brasil, nos últimos 12 anos, se ele tivesse apenas tentado desconversar ou negar as evidências.O saque da Petrobrás foi mencionado de forma polida, em documentos divulgados na semana passada pelo FMI, por meio de referências a investigações na empresa. Um relatório redigido ainda mais cautelosamente mencionou "questões internas" (internal issues) da Petrobrás. A palavra corrupção foi usada apenas uma vez, numa entrevista coletiva do economista-chefe da instituição, Olivier Blanchard, mas com impacto especial: ele se referiu a problemas "do Brasil", sem se limitar ao caso de uma estatal.O ministro preferiu explorar o lado, por assim dizer, positivo dos últimos escândalos. Num painel em Washington ele mencionou as investigações conduzidas pelos meios de comunicação e a ação da Justiça. Imprensa e Judiciário foram por ele descritos como independentes e capazes de agir livremente na procura e na determinação dos fatos. Em Nova York, num evento promovido pela Bloomberg, ele ofereceu uma resposta mais longa. "O Brasil", disse ele, "é um dos países mais transparentes do mundo, onde tudo é discutido, onde o governo é responsabilizado pelo que faz, onde temos eleições regularmente e as pessoas que cometem transgressões vão para a cadeia." Essa descrição dos fatos pode ter sido um tanto enfeitada, mas tem um parentesco inegável com a realidade. Tem havido investigações, pessoas têm sido presas, muita informação tem circulado e a imprensa tem cumprido um papel apreciável, assim como a Polícia Federal, a Procuradoria e a Justiça. Há muito mais, e o ministro sabe disso, para ser investigado e ainda é cedo para dar como certas a condenação e a punição dos maiores responsáveis pelos malfeitos. Mas o ministro soube explorar a melhor parte dos fatos conhecidos. A palavra " reconstrução", no entanto, pode ser usada para descrever amplamente as novidades levadas a Washington, para a reunião do FMI, e a Nova York. Em resumo: o ministro anunciou a mudança da política econômica, o fim dos rompantes terceiro-mundistas, pelo menos na Fazenda, e o abandono da irresponsabilidade fiscal. Ele apareceu como representante de um país seriamente abalado por um acúmulo de enormes erros econômicos, mas com possibilidade de retorno à racionalidade. A mensagem, aparentemente, foi bem avaliada.