17 de maio de 2010 | 00h00
Mas tudo tem limite. O governo decidiu, afinal, resistir às pressões corporativas. Em reunião com 15 ministros, realizada no dia 10 à noite, o presidente Lula recomendou-lhes que não agissem como sindicalistas e reclamou de dirigentes de autarquias e empresas estatais que vinham encampando as reivindicações de grevistas, mesmo sabendo que não há dinheiro em caixa para novos reajustes. O governo não vai conceder mais reajustes ao funcionalismo, disse o ministro do Planejamento, Paulo Bernardo, para "não colocar em risco a nossa responsabilidade fiscal e ameaçar a estabilidade do próximo governo". Outra determinação do Planalto é descontar os dias parados do pagamento dos grevistas.
Já era tempo. Prevê-se que a folha de pessoal dos Três Poderes, abarcando mais de 1 milhão de servidores, custe R$ 183 bilhões em 2010, e estes são gastos incomprimíveis, nada tendo a ver com os cortes em despesas de custeio que o governo promete fazer. Isso para ficar apenas nos dispêndios com o pessoal da ativa. Em 2010, o regime de previdência do setor público federal deverá registrar um saldo negativo de R$ 24,3 bilhões, rombo que deve aumentar para R$ 32,4 bilhões no próximo ano, segundo cálculos do Ministério da Previdência.
Para um governo que, de um ano para o outro, aumentou a folha de pagamento da União em cerca de R$ 21 bilhões, a nova atitude é uma evolução. Como se espera que faça se for aprovado o reajuste de 7,7% dos proventos dos aposentados que recebem mais de um salário mínimo, o presidente deve vetar outros projetos que vierem a conceder benefícios, sem que haja a devida provisão de recursos, dentre a profusão de iniciativas que tramitam no Congresso.
Levantamento feito pelo deputado Arnaldo Madeira (PSDB-SP) revelou que existem 10 projetos de lei, 18 propostas de emendas constitucionais e 12 medidas provisórias que, se aprovados, representariam um gasto de nada menos do que R$ 59 bilhões. Todos estão em desacordo com a LRF. Só um projeto de reestruturação de um plano de carreiras no Judiciário custaria R$ 6,3 bilhões a partir de 2011.
É uma bagunça, como disse Madeira, e para a base governista colocar ordem na casa é política ou eleitoralmente espinhoso. O deputado Cândido Vaccarezza (PT-SP) chegou a propor um "recesso branco" a partir de 10 de junho, o que seria a escapatória, já que o governo, pela lei eleitoral, não pode conceder reajustes salariais a partir de julho.
A situação exigia uma ordem de cima para barrar as reivindicações salariais oportunistas e reverter uma perigosa tendência. Mesmo com o crescimento acelerado da economia, com reflexos no aumento da arrecadação, continua a ser um desafio cumprir, sem os costumeiros truques contábeis, a meta de um superávit primário das contas do setor público de 3,3% do PIB em 2010.
Apesar do que disse Lula, nem todo o governo parece convencido de que a máquina burocrática no Brasil constitui um pesado fardo. Estranha-se a declaração do ministro da Fazenda, Guido Mantega, de que os gastos com o funcionalismo na ativa não são exagerados, representando cerca de 5% do PIB. Para muitos economistas, essa taxa de dispêndios com pessoal, muito superior à de investimentos públicos federais, ultrapassa um nível condizente com a sensatez.
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