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Lupa verde

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Por Xico Graziano
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São Paulo virou, definitivamente, a página do desmatamento. Em vez de suprimir, os agricultores agora recuperam a vegetação natural. Quem garante é o recente censo agropecuário do Estado de São Paulo. Excelente notícia. Intitulado Levantamento Censitário das Unidades de Produção Agropecuária (Lupa) e realizado pela Secretaria Estadual de Agricultura e Abastecimento, o estudo mostra que as propriedades rurais do Estado de São Paulo ampliaram sua cobertura florestal, passando de 10% para 11,87% da área total das fazendas. Tendo como base 2007/8, a área de matas nativas soma 2.432.912 hectares. Com relação ao levantamento anterior, feito há 12 anos, houve um aumento, declarado, de 478 mil hectares de matas no território paulista. É fantástico. Essa área de vegetação natural levantada no censo exclui os parques e reservas florestais, mantidos em unidades públicas de conservação ambiental, como a Serra do Mar. Quer dizer, o acréscimo ocorreu nos remanescentes de vegetação mantidos pelos particulares, dentro de suas propriedades rurais. Tal tendência conservacionista já havia sido detectada no Inventário Florestal do Estado de São Paulo, divulgado em 2005. Baseado em leitura e interpretação de imagens de satélite, a análise, comandada pelo Instituto Florestal, indicava, na época, um acréscimo de 126,6 mil hectares na cobertura natural do território paulista. Segundo o inventário, considerando áreas públicas e privadas, 13,84% do Estado encontrava-se protegido por vegetação nativa. Essa informação será atualizada pela Secretaria Estadual de Meio Ambiente, que deve apresentar os novos dados do Inventário Florestal até o final de 2009. Restará, certamente, comprovado que São Paulo se recupera do estrago ecológico feito no passado. Ainda bem. Um importante indicador dessa verdadeira lição de casa ambiental reside no cadastro do projeto estratégico denominado Mata Ciliar. Nele estão arroladas as áreas de preservação permanente, declaradas por seus detentores, que se encontram em processo de recuperação florestal. Basicamente representam beiradas de brejo e nascentes d?água, margens de rios, córregos e reservatórios. Iniciativa inédita, o governo já contabiliza nesse sistema cerca de 300 mil hectares, locais onde a produção rural, sejam pastos ou lavouras, se encontra impedida. Fica, em decorrência, estimulada a vegetação natural. A leitura das imagens de satélite, metodologia utilizada no Inventário Florestal, no entanto, não consegue detectar a recuperação das matas ciliares antes do prazo mínimo de cinco anos. Acontece que as árvores, plantadas ou nascidas naturalmente, precisam de tempo para crescer, formando capões de matas possíveis de ser detectados na fotografia aérea. Somente a partir de 2013 as imagens distantes serão capazes de anotar com maior precisão o resultado do trabalho de recuperação das matas ciliares no território paulista. Tudo bem. Porque a tarefa será árdua e longeva. Fruto do processo histórico de ocupação, que recomendava desmatar até a barranca do rio, o governo estadual estima haver hoje 1,4 milhão de hectares de matas ciliares depauperadas, ocupadas pela agropecuária em São Paulo. E aposta que será necessário um prazo de 25 anos para concretizar sua recomposição vegetal. Quem, entretanto, já plantou árvores sabe que o trabalho custa, mas a sombra delas compensa. Embora ainda invisíveis pelos satélites, quem anda pelo interior afora já percebe a formação, especialmente nas baixadas, de "corredores ecológicos". Apesar de incipientes, eles começam a cumprir funções ambientais relevantes na defesa da biodiversidade e das águas. Nas microbacias hidrográficas, locais onde os agricultores se organizam para, conjuntamente, promover a formação desses bosques lineares, a paisagem rural está-se modificando. A fauna retorna. Pássaros, répteis e mamíferos, desaparecidos, ressurgem como se escondidos estivessem tantos anos com medo da civilização. É incrível a capacidade de recuperação da natureza. Onças pardas despontam por aí, assustando bezerros. Para não falar das capivaras. Falta reaparecerem os peixes. Os agricultores, sempre culpados pelos problemas ambientais da Nação, aguardam os citadinos coletarem e bem tratarem os esgotos domésticos, pois, despejados nos rios, viram venenos para a fauna aquática. O impostergável saneamento urbano, associado à recuperação das matas ciliares do campo, permitirá que o azul das águas se reconcilie com o verde da biodiversidade. As boas notícias trazidas pelo censo agropecuário/Lupa comprovam também que avança na agricultura paulista a conservação do solo. As práticas de controle de erosão se ampliaram em 22% nas propriedades rurais. O plantio direto, a mais avançada técnica conservacionista da agricultura, passou de 550 mil para 760 mil hectares cultivados em São Paulo. Boa prática da agronomia tropical. Sustentável e socialmente justa. O censo agropecuário paulista atesta que diminuiu de 72 para 63 hectares o tamanho médio da propriedade rural. Olha só, significa que o avanço da tecnologia favoreceu a pequena propriedade, impedindo a concentração fundiária. O discurso esquerdista, que amaldiçoa o agronegócio, ficou vazio. Dançou na ideologia. A despeito dos problemas ecológicos, reduzidos, mas ainda persistentes, como o uso impróprio de agrotóxicos e as queimadas de cana, a agricultura paulista assume crescentemente sua face conservacionista. Olhada pela lupa, a agenda rural se esverdeia. E se democratiza. Sorte do futuro. Xico Graziano, agrônomo, é secretário do Meio Ambiente do Estado de São Paulo. E-mail: xico@xicograziano.com.br Site: www.xicograziano.com.br