Imagem ex-librisOpinião do Estadão

Luz na discussão

É imprudente cobrar uma ampla redução de juros antes de um firme controle da inflação, assim como é insensato pensar em medidas de crescimento de curto alcance e de alto custo para um Tesouro quase quebrado

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Por Redação
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Pode haver mais de uma receita para o crescimento econômico, mas nenhuma dá certo sem aumento da produtividade e sem um mínimo de ordem nos fundamentos, isto é, sem alguma eficiência no gasto oficial, disciplina da dívida pública e severo controle da inflação. Sem isso, o resultado, na melhor hipótese, é o voo de galinha. Na pior, é o desastre. Essas verdades simples foram muitas vezes comprovadas pela experiência internacional – e mais uma vez, de forma especialmente dolorosa, pela crise brasileira dos últimos anos. Pressupostos indispensáveis para qualquer debate razoável sobre política econômica, esses pontos foram lembrados nos últimos dias pelo ministro da Fazenda, Henrique Meirelles, e pelo presidente do Banco Central (BC), Ilan Goldfajn. Falando em eventos e locais diferentes, ambos foram um pouco além das tentativas habituais de explicar e defender as políticas fiscal e monetária.

Tentaram adicionar alguma racionalidade a uma discussão tão importante quanto prejudicada pela desinformação, pelas palavras de ordem, pelo falatório apaixonado e mistificador e pelo fascínio das soluções simples e de efeito imediato. Soluções desse tipo já foram tentadas no Brasil. O sucesso inicial de público foi sempre seguido de amarga decepção e de agravamento dos problemas.

Na véspera da aprovação do teto de gastos pelo Senado, o ministro da Fazenda falou sobre o roteiro fundamental do governo: consolidada a trajetória do ajuste fiscal, será possível, “com segurança”, trabalhar numa agenda para aumento da produtividade. Com despesas mais controladas, o governo terá mais dinheiro para investir, mas isso deve ser apenas uma parte da tarefa.

A pauta deve incluir muitos outros objetivos, alguns tão simples quanto importantes, como a facilitação do registro de empresa e do cumprimento das obrigações tributárias. Mesmo sem explicitação pelo ministro, a longa relação de tarefas é conhecida e inclui, entre os itens politicamente mais complexos, uma indispensável reforma tributária. Mas nada se fará com segurança e de forma duradoura, como insistiu o ministro, sem o controle do gasto e da dívida pública.

Falando no dia seguinte em São Paulo, o presidente do BC também contribuiu para a conversão do berreiro e do falatório exaltado em algo mais parecido com um debate. Procurou chamar a atenção para as questões centrais, como a produtividade, indispensável para o crescimento de longo prazo. Lembrou o efeito multiplicador dos investimentos em infraestrutura (pela redução de custos e de riscos das atividades produtivas), a importância de tornar o ambiente de negócios mais favorável à atividade do setor privado e “outras vertentes importantes” de modernização, como o avanço nas concessões e nas privatizações, as mudanças no sistema tributário e nas normas trabalhistas, a reforma do ensino médio e o projeto de autonomia operacional do BC.

Mas a arrumação das contas públicas é o passo inicial para mudanças de alcance mais longo, lembrou Ilan Goldfajn, e para a necessária e tão desejada redução dos juros a níveis mais toleráveis. Neste ponto ele centrou sua mensagem no papel e no alcance da política monetária. É um engano, insistiu, cobrar o corte de juros sem uma firme perspectiva de contenção dos preços.

Essa perspectiva é hoje mais clara. A inflação chegou a 10,7% no fim de 2015. As projeções indicam uma taxa próxima de 6,5% em 2016 e novas quedas em 2017 e 2018. As expectativas só estão ancoradas, sublinhou, porque a política monetária deu resultado.

Mas ganhos duradouros contra a inflação e a criação de condições para o crescimento dependerão também, lembrou Goldfajn, da política fiscal. Não cabe à política monetária, explicou, cumprir também esse papel. É imprudente cobrar uma ampla redução de juros antes de um firme controle da inflação, assim como é insensato pensar em medidas de crescimento de curto alcance e de alto custo para um Tesouro quase quebrado. Mágicas fracassaram e custaram muito ao País. É hora de mais um retorno à racionalidade, já testada com sucesso no Plano Real.