17 de março de 2014 | 02h05
No ano passado a contenção das tarifas de eletricidade custou diretamente ao Tesouro cerca de R$ 9 bilhões. O governo preferiu subsidiar o consumo de energia elétrica a admitir o repasse dos custos aos consumidores. Errou triplamente, porque assumiu um custo fiscal dispensável, impôs às distribuidoras uma situação insegura, dificultando seu planejamento, e enviou um sinal enganador aos consumidores, estimulando-os a elevar o consumo de energia. Nem os primeiros sinais de maiores dificuldades, com a escassez de chuvas em áreas muito importantes, animaram o governo a reconhecer os problemas e a admitir a conveniência de um consumo mais moderado.
Diante da inegável piora da situação, a presidente e seus auxiliares decidiram traçar um roteiro de ação. Desde o começo do ano, a provisão orçamentária de R$ 8 bilhões para cobrir as contas da energia foi considerada insuficiente por muitos analistas. Alguns chegaram a apontar uma necessidade mínima na faixa de R$ 18 bilhões. Segundo estimativa recente, o setor elétrico acumulou em um ano custos adicionais de R$ 32,4 bilhões. Esse valor inclui o custo da renovação de concessões, nos termos impostos pelo governo, e os prejuízos decorrentes da estiagem. A soma pode ser muito maior se for considerada a redução do valor de mercado das empresas, uma consequência das perdas inevitáveis impostas pela política federal.
Sem condições de continuar adiando alguma providência, o governo anunciou na quinta-feira passada a operação de socorro, depois de uma reunião da presidente Dilma Rousseff com os ministros da Fazenda e de Minas e Energia. O esquema apresentado pelo ministro Guido Mantega inclui um repasse adicional de R$ 4 bilhões do Tesouro Nacional e a autorização para a Câmara de Comercialização de Energia Elétrica (CCEE), onde é negociada a eletricidade disponível no mercado, levantar R$ 8 bilhões em financiamento bancário.
Os consumidores só receberão a conta aumentada no próximo ano - depois, portanto, das eleições. Em campanha eleitoral permanente, Dilma continua disposta a causar o mínimo incômodo possível aos consumidores-eleitores. Na equação política do governo, cada real poupado neste ano na conta de luz poderá resultar em votos para a presidente e para seus aliados. Não importam, por enquanto, os efeitos danosos da falsificação dos custos.
Para completar o arranjo, o governo poderá, segundo o ministro da Fazenda, elevar alguns impostos. Mas ele mesmo admitiu, na patética entrevista de quinta-feira, desconhecer de onde virá essa receita adicional. O esquema também deve incluir a reabertura do Refis, o programa de refinanciamento de dívidas tributárias. Esse programa, um incentivo à sonegação, rende algum dinheiro quando é reaberto, mas é logo abandonado por boa parte dos beneficiários.
A tentativa de disfarçar os problemas vai apenas adiar o pagamento e encarecer a conta. Se a CCEE conseguir o financiamento de R$ 8 bilhões, terá de pagar juros. Em algum momento isso será repassado aos consumidores, ou as empresas terão de absorver mais esse custo. Se novas intervenções do Tesouro forem necessárias, as contas fiscais, já em risco, ficarão em pior estado. A fatura da demagogia pode ser adiada, mas é sempre muito alta.
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