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Mais um governador cassado

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Por Redação
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Pela segunda vez em quatro meses, o Tribunal Superior Eleitoral (TSE) cassou o mandato de um governador de Estado vitorioso no pleito de 2006, determinando a sua substituição pelo segundo mais votado na disputa. Correm no TSE processos visando outros seis governadores (e seus vices) - do Amapá, Rondônia, Roraima, Santa Catarina, Sergipe e Tocantins. Resultam de recursos apresentados pelas coligações derrotadas nas urnas contra a sua diplomação. (No caso de Sergipe, a sigla impetrante, o PTB, se desinteressou da ação para cassar o reeleito Marcelo Déda, do PT.) Descontadas as peculiaridades de cada caso, a acusação de fundo é a mesma: abuso de poder e uso das administrações estaduais para a conquista de votos. Em português corrente, corrupção eleitoral. Em novembro, o TSE destituiu o paraibano Cássio Rodrigues da Cunha Lima, do PSDB, por ter promovido a distribuição a eleitores de 35 mil cheques nominais, emitidos por uma fundação, acompanhados da mensagem: "Esse é um presente do governador. Lembre-se dele." Na madrugada da quarta-feira, a Corte aprovou o afastamento do maranhense Jackson Lago, do PDT, acusado, entre outras coisas, de se beneficiar de um esquema montado pelo seu antecessor e aliado José Reinaldo Tavares, incluindo transferências ilegais a 156 municípios, distribuição de combustível, assinatura de convênios com entidade fantasma e construção de casas na periferia de São Luís em troca de votos, além da omissão de dados na prestação de contas da campanha. Por motivos óbvios, muitos políticos criticam a "judicialização da política, que contraria a vontade do eleitor", e a suposta "tentação do messianismo" a que estaria sucumbindo a Justiça Eleitoral. "Daqui a pouco quem vai escolher governador vai ser o Ministério Público e a Justiça. Cassação é coisa muito grave para virar rotina", protesta, por exemplo, o senador cearense Tasso Jereissati, do PSDB, esquecido, talvez, de que a sua agremiação nasceu da repulsa ao fisiologismo e à mentalidade do "quebrei o Estado, mas fiz meu sucessor". A rotina que precisa ser quebrada é a da coexistência dos piores e mais arcaicos costumes políticos com um sistema eleitoral avançado, com cadastros informatizados de eleitores e urnas eletrônicas. "Depois da segurança do voto", argumentava em 2002 o então presidente do TSE, Nelson Jobim, "chegou a vez da validade do voto", com o combate à contaminação das preferências eleitorais mediante o uso da máquina administrativa e de outros recursos de poder - compra de votos, em suma. Para isso, combinaram-se dois movimentos na esfera da sociedade e das instituições. O primeiro foi a decisiva mudança na legislação eleitoral proporcionada pela mobilização cívica capitaneada pela CNBB em torno da consigna "Voto não tem preço, tem consequências". A campanha, com mais de 1 milhão de assinaturas, desaguou em 1999 na aprovação da primeira lei de iniciativa popular, incorporando à Lei Eleitoral o artigo 41-A. O texto pune com a cassação do registro ou do diploma quem "doar, oferecer, prometer ou entregar ao eleitor, com o fim de obter-lhe o voto, bem ou vantagem pessoal de qualquer natureza". O segundo movimento - que tira o sono dos doadores, ofertantes e promitentes - é a disposição da Justiça Eleitoral de ir às últimas na punição aos corruptores comprovados. Lamentavelmente, a lentidão dos processos, desde o recebimento das denúncias até a sentença final, é incompatível com o zelo pela integridade da disputa eleitoral. Cassam-se governantes quando já cumpriram pelo menos a metade dos seus mandatos. E não é só. Chicanas jurídicas deram a Cunha Lima uma sobrevida de três meses no cargo. Jackson Lago também permanecerá na função até o julgamento do último dos recursos que apresentar contra a cassação. Ainda assim, é inquestionável a função pedagógica das punições. O simples fato de oito dos governadores da safra 2006 terem sido levados às barras do TSE deve inibir boa parte dos políticos que, de outro modo, partiriam na próxima rodada para a compra de votos por se achar fora do alcance da lei.