11 de maio de 2010 | 00h00
A obra Marxismo e Descendência consta de três partes: I - A doutrina marxista do Estado, II - A doutrina marxista da sociedade e III - A doutrina marxista do pensamento.
Na primeira parte, o autor desenvolve os seguintes itens:
1 - A doutrina do Estado patrimonial;
2 - A meditação de Marx sobre o Estado;
3 - Presumível legado marxista inspirador de Lenine;
4 - A inspiração de Marx, presente na concepção leninista do Estado;
5 - Ação teórica e prática de Lenine na estruturação dos institutos básicos do sistema totalitário.
A segunda parte consta destes itens:
1 - Como se deu a organização do Partido Comunista Francês;
2 - Esgotamento do Partido Comunista na vida política e cultural francesa;
3 - O amadurecimento do cientificismo francês;
4 - A doutrina da sociedade de Marx;
5 - Superação das lacunas da doutrina marxista da sociedade pela sociologia francesa, na obra de Durkheim;
6 - Aprofundamento do cientificismo pelos discípulos e eliminação da divergência com o marxismo;
7 - O estruturalismo como exacerbação do cientificismo, a adesão do marxismo e seu desfecho.
Na terceira parte são desenvolvidos estes itens:
1 - A filosofia de Marx;
2 - A tradição filosófica e a problemática contemporânea;
3 - A recepção do marxismo nos principais países europeus (fins do século 19 e início do século 20);
4 - A estruturação da vulgata marxista;
5 - Duas tentativas de interpretação autônoma e seu desfecho;
6 - A tentação do niilismo.
Da análise feita por Paim fica claro que, para Karl Marx (1818-1883), um elemento permanece constante, como finalidade essencial, em toda a sua obra: conquistar a vitória do proletariado nas sociedades europeias ocidentais (Alemanha, França, Inglaterra) mediante a eliminação violenta do Estado burguês. Marx considerava ser ele o líder único e infalível dessa revolução. Para conseguir esse seu intuito não duvidou em sacrificar os fatos aos seus esquemas teóricos.
A verdade claudicou diante da militância política. Marx foi desmoralizando, um a um, todos os pensadores e líderes socialistas que tinham aderido a um socialismo democrático, diferente do modelo totalitário por ele apregoado. Fez isso, por exemplo, na Alemanha, contra Ferdinand Lassalle (1825-1864) e, na França, contra Pierre-Joseph Proudhon (1809-1865). Paim deixa claro que houve influência muito grande do regime apregoado por Marx sobre o adotado na Rússia, após a Revolução de 1917, por Lenine (1870-1924). Para ambos, somente valia um tipo de comunismo: o imposto pelo líder, com total banimento da dissidência. Na Rússia, o regime bolchevique foi o novo capítulo do "despotismo oriental" czarista.
Paim destaca que o comunismo proposto por Marx terminou se aproximando do cientificismo francês, tematizado pelos filósofos que, a partir de início do século 19, queriam banir o individualismo e o capitalismo, a fim de substituí-los por uma forma de coletivismo apregoado em nome da ciência social emergente com o nome de "sociologia". Esses pensadores foram, na sua ordem, Claude-Henri de Saint-Simon (1760-1825), Augusto Comte (1798-1857), Pierre-Joseph Proudhon, Jules Guesde (1845-1922) e Jean Jaurès (1859-1914).
Após a morte de Marx, Émile Durkheim (1858-1917), herdeiro da tradição cientificista de Comte e Saint-Simon, completou a formulação da sociologia francesa, atribuindo-lhe uma finalidade dogmática e outra prática: a parte dogmática consistiria numa doutrina em que a realidade deveria ser moldada a partir de um conceito totalizante de sociedade orgânica (sendo a estrutura social anterior aos indivíduos); do lado prático, essa ciência estaria chamada a libertar de vez a sociedade dos vícios do individualismo, mediante a implantação definitiva de um vago socialismo, que o Partido Comunista Francês sempre interpretou como o comunismo nos moldes soviéticos. Surgia, assim, no panorama intelectual francês, o conceito de "ciência engajada", que teve continuidade, com as mesmas características fixadas por Durkheim (doutrina totalizante e finalidade prática de estabelecer um socialismo genérico), nos momentos subsequentes do estruturalismo formulado por Claude Lévy-Strauss (1908-2009) e do estruturalismo marxista de Althusser (1918-1990).
A obra de Antonio Paim é uma contribuição de grande valor crítico para a cultura brasileira, levando em consideração que, entre nós, terminou vingando o mesmo esdrúxulo conceito de ciência social dogmática, a serviço da implantação de um socialismo autoritário, na trilha identificada por Leônidas de Rezende, em 1918, de aproximação entre marxismo e positivismo, no contexto mais amplo da velha tradição cientificista que remonta, no panorama luso-brasileiro, às reformas do marquês de Pombal.
COORDENADOR DO CENTRO DE PESQUISAS ESTRATÉGICAS DA UFJF E-MAIL: RIVE2001@GMAIL.COM
Encontrou algum erro? Entre em contato