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Opinião|Melhor governo com menos corrupção

Com transparência e ética transformaremos esse mar de lama num jardim florido

Atualização:

A urgente retomada do desenvolvimento econômico e a geração de empregos dependem fundamentalmente de grandes obras de infraestrutura. No cenário econômico atual, em que o Estado deve cumprir suas obrigações indelegáveis nas áreas de educação, saúde e segurança, é essencial tornar viáveis parcerias público-privadas(PPPs) com o setor produtivo para a construção de empreendimentos e a operação de serviços essenciais, com vista ao desenvolvimento e modernização dos Estados para que ofereçam ampla infraestrutura.

O atual cenário político brasileiro traz à tona a discussão sobre a necessidade de um novo modelo de relacionamento entre os entes público e privado. É preciso dar um basta nessa relação espúria entre gestores públicos e privados, afinal, os governos precisam da expertise e do capital das empresas para alavancarem investimentos e estas, do poder público para realizar projetos estruturantes. Quem deve ganhar com essa relação não são os políticos ou empresários, mas a sociedade, que se beneficia com os serviços prestados e a geração de empregos e renda.

É árdua a tarefa de pôr fim à cultura de corrupção em que empresários já calculam o valor dos projetos incluindo a propina a ser paga a fiscais e políticos. Mas, em tempos de Lava Jato, chegou o momento ideal de mudar o paradigma.

Os mecanismos de governança e as boas práticas anticorrupção, como compliance e programas de integridade, já são adotados por empresas privadas e públicas no Brasil, mas devem ser introduzidos definitivamente na cultura empresarial e institucional. Com o fortalecimento do compliance nas empresas surge finalmente a oportunidade de criar novo modelo de relacionamento entre público e privado, com integridade, ética e transparência. Esses conceitos precisam estar presentes em ambos os lados, ou seja, também devem ser adotados por órgãos e instituições públicas, afinal, nenhuma empresa global vai investir num país que não confira segurança jurídica ao investidor, com modelos institucionais consolidados de garantia recíproca e de previsibilidade.

Regular essa relação é uma necessidade, mas é preciso também que o poder público evolua no modelo de contratação de serviços, obras de infraestrutura e aquisição de produtos. O Brasil está acostumado, por uma legislação arcaica, a fazer licitações em que o governo não diz apenas o que quer comprar ou construir, mas detalha todos os procedimentos e insumos que deseja para atingir tal finalidade.

Chegou a hora de o País adotar mecanismos que permitam ao setor público fazer compras e contratações apontando três exigências básicas: preço, prazo e qualidade. É irrelevante se a empresa usará a técnica X ou Y para atingir o objetivo final, o importante é a entrega do que foi contratado com a qualidade exigida, o menor preço possível e no prazo solicitado.

Para que o modelo de contratação da PPP seja fortalecido é fundamental a adoção de mecanismos de seguro-garantia, como o performance bond, utilizado para assegurar a plena execução dos contratos.

Geralmente, grandes obras de infraestrutura levam anos para ser realizadas e demandam aporte financeiro inicial elevado. Na primeira fase da obra, que pode chegar a cinco anos ou mais, a empresa contratada aplica os recursos na execução do contrato, na aquisição de máquinas, material e mão de obra. Essa é a etapa em que o privado aporta a maior parte do investimento. Com a conclusão do empreendimento inicia-se a fase de operação. É nesse período, de até 25 anos, que o privado será remunerado pelo forte investimento inicial e pela prestação do serviço público, mediante o pagamento de tarifas, a exemplo da operação de uma estrada, linha de metrô, aeroporto ou qualquer outro sistema.

Não raro empresas pedem falência ao longo da construção de uma grande obra ou os governos interrompem os pagamentos a essas mesmas empresas. O resultado é desastroso: paralisação das obras ou serviços e população prejudicada.

Nesse contexto, dois atores têm papel fundamental na contratação da obra ou serviço público: os fundos de investimento e as seguradoras. Com a adoção do performance bond os contratos não são interrompidos, a empresa inadimplente é substituída de forma imediata, garantindo a execução do projeto e a manutenção dos empregos. Além de assegurar o pagamento e a continuação de obras e serviços, o agente garantidor atua de fato na rigorosa e independente fiscalização do cumprimento das exigências previstas em contrato.

Toda garantia tem um custo e o performance bond não é diferente. São nítidas, no entanto, as vantagens obtidas com a segurança da entrega da obra no prazo e no preço inicial estabelecido, ainda que haja um acréscimo mínimo em seu valor global. Os recentes escândalos envolvendo o superfaturamento na construção de grandes empreendimentos em diversas regiões do País são prova cabal de que os contratos de obras públicas não devem ser celebrados sem a previsão de tais mecanismos garantidores.

Com a falta de recursos cada vez maior no setor público, a participação do privado aportando todo o investimento e sendo remunerado ao longo da concessão do serviço se torna um caminho natural. E não faltam no mundo fontes internacionais de investimento de risco em obras de infraestrutura interessadas em aplicar no Brasil recursos de longo prazo.

Os brasileiros e os grandes players globais anseiam por um novo modelo de relacionamento entre entes públicos e privados, com transparência, ética e moralidade. O desafio é tornar viável a retomada de parcerias para a consecução de grandes obras de infraestrutura, apoiadas em garantias efetivas e céleres, que confiram segurança a ambas as partes. Se conseguirmos implantar esse modelo, em pouco tempo transformaremos esse mar de lama num jardim florido.

*Secretário de Energia e Mineração do Estado de São Paulo

Opinião por João Carlos de Souza Meirelles