
03 de fevereiro de 2012 | 03h05
Conhecida pela imprensa há poucos dias, a ameaça de anulação do acordo com o México vai na direção do protecionismo, como se o fechamento do mercado eliminasse os pontos fracos da produção nacional. Além de não resolver o problema, esse tipo de política vicia o organismo econômico e acaba sendo um fator de atraso. Perde o consumidor, tolhido em sua escolha, e a própria indústria, protegida como incapaz, deixa de se transformar, de crescer e de gerar mais e melhores oportunidades de trabalho. O Brasil já viveu essa experiência e com certeza nenhuma pessoa sensata e capaz de pensar no longo prazo deseja repeti-la.
Em vez de abandonar esse acordo, o Brasil deveria, juntamente com os parceiros do Mercosul, buscar a ampliação dos compromissos com o México até alcançar um pacto de livre comércio. Se o País se tornou deficitário nas trocas do setor automotivo, o razoável é identificar os problemas e tentar resolvê-los.
Se a raiz dos problemas estiver no México, o primeiro passo deve ser a busca de um entendimento, talvez de uma revisão do acordo. Mas é inútil gastar muito tempo com essa hipótese. Os grandes problemas estão mesmo no Brasil e afetam muito mais que o comércio de um tipo de produto - do setor automotivo - com um parceiro definido - neste caso, o México.
As dificuldades são conhecidas há muito tempo, mas é útil conhecer os trabalhos divulgados ultimamente pelo Iedi. Esses estudos acrescentam detalhes interessantes ao quadro geral das dificuldades da indústria para ocupar e até para manter espaços tanto no mercado externo quanto no interno.
Uma análise recente mostra como o déficit comercial se distribui entre segmentos industriais classificados segundo o grau de tecnológica. No nível mais alto, o déficit aumentou de US$ 26,2 bilhões em 2010 para US$ 30 bilhões no ano passado. Só uma classe de indústria desse grupo, a aeronáutica, obteve um pequeno superávit, de US$ 179 milhões. A maior parte do rombo ocorreu no comércio de eletrônicos e farmacêuticos.
O déficit chegou a US$ 52,4 bilhões no grupo dos produtos de média-alta tecnologia. As exportações da indústria automotiva aumentaram, assim como as dos setores de produtos químicos e de equipamentos, mas o crescimento das importações foi muito maior. O desempenho foi melhor nas faixas de média-baixa e baixa tecnologia, com déficit de US$ 9,3 bilhões na primeira e superávit de US$ 42,9 bilhões na segunda. Nesta se incluem, obviamente, as indústrias de alimentos e de bebidas, madeira, papel e celulose. As indústrias têxteis, de roupas e de calçados, incluídas no grupo de baixa tecnologia, foram deficitárias.
O superávit das empresas de baixa tecnologia, somado ao da agropecuária, foi muito mais que suficiente para compensar o rombo dos outros setores e garantir um saldo positivo final de US$ 29,8 bilhões.
O cenário é de "commoditização" do saldo comercial. Isso se deve principalmente às dificuldades de competição da indústria. O estudo do Iedi repete, sem se alongar, a lista conhecidíssima de fatores - câmbio desfavorável, capacidade ociosa na indústria asiática, deficiência de infraestrutura, tributação ruim, escassez de recursos humanos, etc.
Diante desse quadro, romper o acordo com o México é tão racional quanto espetar uma agulha num boneco de vodu. Pensamento mágico nunca produziu política econômica eficiente.
Encontrou algum erro? Entre em contato