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Ministro está vendo ''sangue''

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Por Redação
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E depois ainda dizem que a classe política é um espelho da sociedade. Pode ser em alguma outra sociedade, mas, definitivamente, não aqui. Os brasileiros comuns temos nossa cota de defeitos e maus costumes, porém a grande maioria dos políticos é outra coisa. E que coisa! Pode-se estender o braço mantendo os olhos fechados e, com toda a probabilidade, se agarrará um exemplo do que a política faz com as pessoas - ou do que são as pessoas que fazem da política o seu negócio.O assunto em pauta, no momento, é o deputado federal Mário Sílvio Mendes Negromonte, que se licenciou do seu quinto mandato consecutivo para assumir o Ministério das Cidades. Pernambucano de nascimento, fez carreira na Bahia, primeiro no PMDB, depois no PSDB e, por fim, no PP - cuja bancada o indicou para a pasta, e a presidente Dilma Rousseff aquiesceu, embora preferisse ter mantido o também pepista Márcio Fortes. Pois bem. Na semana passada, pelo menos 28 dos 41 membros da representação do partido na Câmara exigiram a cabeça do líder Nelson Meurer e a sua substituição pelo colega Aguinaldo Ribeiro.Até aí nada de mais, ainda que eles tenham ido muito além do que os deputados peemedebistas, descontentes, por sua vez, com o seu líder Henrique Eduardo Alves, a quem acusam de não ouvi-los e de não batalhar por seus pleitos para a nomeação de apaniguados para cargos sabe-se lá em que escalão no governo. Trata-se, aliás, de uma engraçada repetição das queixas que o mesmo Alves não se cansava de fazer à presidente Dilma até receber dela o afago por que arfava: o aval à aspiração de ser o candidato da base ao comando da Câmara em 2013. No PP, as reclamações contra Meurer não eram diferentes, com a peculiaridade, porém, de que o dono da cabeça reclamada e Negromonte são aliados próximos. Pior ainda, segundo a revista Veja, ele teria oferecido um mensalinho de R$ 30 mil aos insatisfeitos para que deixassem Meurer no lugar. Por seu intermédio, o ministro manteria o controle da bancada, em detrimento da facção alinhada com o ex Márcio Fortes. Naturalmente, ele negou e ainda contou que a presidente, com quem esteve no fim da semana, o teria aconselhado a não fazer o que fez Wagner Rossi na Agricultura. Não propriamente na sua gestão, mas ao demitir-se em razão de denúncias da imprensa. "Não dê importância a essas matérias", teria dito Dilma.Pode ser, mas o que se ouve no Planalto é que, se ele continuar rolando na lama com os companheiros de partido, poderá perder a pasta, mesmo se não se confirmar a informação da oferta de propina. De todo modo - e eis por que Negromonte se tornou o nome do dia no departamento de baixarias políticas -, na segunda-feira ele deitou falação numa entrevista a uma rádio baiana. Em dado momento, comentando a desavença na bancada pepista, declarou textualmente o seguinte: "Lamento muito que exista uma briga interna. Fica um falando mal da vida do outro. Isso ainda vai terminar em sangue e é muito ruim". Talvez o fato de haver integrado a CPI do Extermínio no Nordeste, em 2003, o tenha ensinado que é muito ruim quando algo termina em sangue. Perto disso, nem vale a pena comentar o seu argumento, na mesma entrevista, de que o fato de ser nordestino pode ter contribuído para a imprensa incluí-lo na "campanha para a retirada de ministros". No caso dele, a retirada será uma consequência natural menos das denúncias de que é alvo do que da perda do apoio da bancada. De mais a mais, a julgar pelo que dizem os seus desafetos, quem manda de fato nas Cidades é a ministra do Planejamento, Míriam Belchior.Um ministro de Estado prever que uma disputa partidária na qual está envolvido pode acabar em sangue, mesmo - como se espera - em sentido metafórico, é um instantâneo de uma espécie de mentalidade que infelizmente está longe da extinção na política brasileira. Ou, para sermos mais exatos, na competição corsária pelo butim dos recursos públicos. Porque, no fundo de tudo, é do que se trata. Não está aí o presidente do Senado, José Sarney, achando a coisa mais legítima do mundo fazer turismo na sua sesmaria a bordo de um helicóptero da PM maranhense?