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Mudanças no ensino médio

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Por Redação
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Por unanimidade, o Conselho Nacional de Educação (CNE) aprovou a proposta do Ministério da Educação (MEC) que reformula radicalmente o currículo do ensino médio - o mais anacrônico e desvinculado da realidade social e econômica do País, quando comparado aos programas do ensino fundamental e superior. A reforma visa a tornar mais atraentes as três séries desse ciclo, que há muitos anos vem registrando taxas preocupantes de evasão no âmbito da rede escolar pública. Segundo o último censo escolar, enquanto 97,6% das crianças e jovens de 7 a 14 anos estão matriculados no ensino fundamental, na faixa dos 15 aos 17 anos apenas 82,1% estudam. E, desse total, só 48% frequentam o ensino médio. Além da falta de qualidade, o ensino médio há muito tempo vive uma crise de identidade, uma vez que não prepara os estudantes nem para os vestibulares nem para o mercado de trabalho. As avaliações do MEC revelam que, enquanto nas escolas convencionais de ensino médio o desinteresse dos alunos é crescente, nas escolas técnicas federais as vagas são tão disputadas que foi necessário criar um rigoroso exame de seleção. O ensino médio é de alçada dos governos estaduais, que são responsáveis por 85% das matrículas. Pela legislação em vigor, o MEC não tem competência para interferir na rede escolar dos Estados e depende da adesão de cada um deles para implementar a proposta aprovada pelo CNE. Para atrair os governadores, o MEC optou por aumentar os repasses federais para os Estados que apresentarem os projetos mais inovadores, substituindo a divisão do currículo em disciplinas tradicionais, como português e matemática, por programas flexíveis, que adotem "eixos interdisciplinares", como ciência, tecnologia, cultura e trabalho. Pelos planos do MEC, os alunos terão liberdade para escolher 20% das disciplinas, conforme seus interesses. A carga horária, que hoje é de 800 horas por ano, deve aumentar para 1.000 horas. Para estimular a diversificação do ensino médio, os Estados terão ampla liberdade para apresentar currículos diferenciados e propostas pedagógicas distintas, desde que sintonizadas com as diretrizes aprovadas pelo CNE. Os repasses começarão no próximo ano e devem ser limitados a apenas cem escolas. Os especialistas consideram esse número insuficiente. Só no Estado de São Paulo, a rede pública tem 5 mil escolas de ensino médio. Como a União reservou R$ 100 milhões para esses repasses, a média prevista é de R$ 1 milhão por escola. Os especialistas também lembram que o MEC não definiu os parâmetros que serão usados para avaliar as experiências mais bem-sucedidas e afirmam que as disciplinas opcionais, por preverem até aulas de capoeira e grafite, podem levar os alunos a perder o foco em sua formação. A maior crítica é que a proposta do MEC seria "eleiçoeira", por causa das eleições presidenciais de 2010. "A condição é que o colégio corresponda à expectativa dos estudantes", rebate o ministro Fernando Haddad, que jamais escondeu a intenção de disputar um cargo majoritário no próximo ano. Quando começou a planejar a mudança no currículo do ensino médio, o MEC também pretendia selecionar as cem escolas públicas com piores resultados no Exame Nacional do Ensino Médio (Enem). No entanto, como poderia suscitar resistência dos secretários estaduais de Educação, por motivos políticos, o CNE sugeriu que a medida fosse deixada de lado. O ministro Haddad acolheu a sugestão e reconheceu que ela elimina entraves políticos que poderiam retardar a transição para o novo modelo. Como de nada adianta modernizar o currículo sem mudar a mentalidade dos professores e diretores de escola, o MEC abriu inscrição para 54 mil vagas em cursos superiores oferecidos por universidades públicas e destinados a professores da rede de educação básica que ainda não dispõem do diploma universitário que a lei exige. Embora a ideia seja qualificar cerca de 331 mil profissionais até 2015, as próprias autoridades educacionais temem que sobrem vagas. Algumas dessas medidas parecem importantes. Todavia, como só começarão a ser implementadas em 2010, e a reforma educacional será um trunfo na campanha eleitoral, é preciso que as mudanças no currículo do ensino médio não sejam comprometidas por interesses políticos.