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Na corda bamba

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Por Redação
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Por um lado, a bancada petista na Câmara dos Deputados padece do desgaste político provocado pela atitude favorável a Eduardo Cunha, que tem sido obrigada a assumir por recomendação “superior”, na tentativa de afastar a possibilidade do processo de impeachment de Dilma Rousseff. Por outro lado, a direção do PMDB teme que os métodos empregados por Cunha para se manter no cargo possam resultar na perda, pelo partido, do comando da Casa. Tudo isso é o resultado da péssima repercussão que teve a truculenta tentativa de Eduardo Cunha e seus aliados de boicotar, na quinta-feira passada, os trabalhos do Conselho de Ética da Casa, que estava na iminência de decidir pela admissibilidade da instauração do processo de cassação do mandato do parlamentar fluminense por quebra de decoro.

Cunha, porém, permanece disposto a não ceder e se prepara para lançar mão de todos os trunfos de que dispõe. Um deles é a notória falta de experiência do presidente do Conselho de Ética, deputado José Carlos Araújo (PSD-BA), que anda tropeçando em minudências regimentais, matéria em que Cunha é reconhecido especialista. A assessoria da Presidência da Câmara está preparando, segundo se informa, um recurso a ser apresentado à Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) da Casa contra o que considera irregularidades cometidas por Araújo. A CCJ é presidida por um aliado de Cunha, o deputado Arthur Lira (PP-PI).

Uma das infrações cometidas pelo presidente do Conselho de Ética seria a não apresentação da ata da reunião anterior na abertura da tumultuada sessão da quinta-feira. Outra, o fato de Araújo ter esperado mais de 50 minutos para obter o quórum que permitia a abertura da sessão, quando o prazo estipulado pelo regimento é de apenas meia hora. São questões formais que nada têm a ver com o mérito do processo contra Cunha. Mas como regimentos existem para serem cumpridos, está aí um excelente pretexto para que Cunha e seus aliados executem mais uma manobra protelatória da decisão final do Conselho de Ética. De qualquer modo, pelos prazos regimentais, já não existe a menor possibilidade de que essa questão seja decidida na atual sessão legislativa, que se encerra em 22 de dezembro.

De qualquer modo, Eduardo Cunha tem contra si a deterioração da própria imagem, que já é significativa em termos de opinião pública e começa a corroer suas bases de sustentação política. Boa parte de seus aliados está no chamado baixo clero do PMDB e partidos da base de apoio ao governo. O caráter eminentemente fisiológico dessa aliança – cimentada, da parte de Cunha, com favores que vão desde a ajuda na obtenção de recursos para campanhas eleitorais até a distribuição de postos relevantes nas comissões internas e na burocracia da Câmara – soma-se e até certo ponto confunde-se com o estreito relacionamento cultivado pelo parlamentar fluminense com grupos suprapartidários que defendem interesses específicos, como a chamada “Bancada BBB” (Bíblia, boi e bala). Nem mesmo esses grupos, porém, estão imunes aos efeitos negativos provocados pela deterioração da imagem de Cunha, especialmente às vésperas de um ano eleitoral.

Mas o presidente da Câmara não perde a pose, confiante em que até o início da próxima sessão legislativa, em 1.º de fevereiro, terá conseguido superar as dificuldades que considera momentâneas. “Todos os dias, faz quatro meses, os mesmos articulistas afirmam que eu vou cair e eu continuo aqui”, declarou com afetado desdém na semana passada. Mas o fato é que Cunha continua onde está em boa medida devido ao apoio encabulado da bancada petista. Ocorre que 34 dos 60 deputados da bancada do PT subscreveram a representação contra Cunha protocolada pelo PSOL e pela Rede no Conselho de Ética. E esses “rebeldes” deveriam se reunir ontem à noite com o ministro-chefe da Casa Civil, Jaques Wagner, para manifestar sua inconformidade, entre outras coisas, com o fato de a bancada não ter sido consultada sobre a aliança tácita com Cunha. A este convém botar as barbas de molho.