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Negociação emperrada

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Por Redação
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Como vem ocorrendo com outras autoridades europeias que visitam o Brasil, o ministro de Comércio Exterior da Bélgica, Pieter De Crem, teve de ouvir, na semana passada, uma firme defesa do acordo comercial do Brasil com a União Europeia (UE) – que depende da concordância dos demais países do Mercosul. Desta vez, a defesa foi feita pelo presidente da Confederação da Agricultura e Pecuária do Brasil (CNA), João Martins da Silva Júnior. É difícil, porém, de entender o alcance e a eficácia de atitudes desse tipo quando se sabe que, como reconheceu o presidente da CNA, o Mercosul é que tem sido “um impedimento para o acordo”. 

Além do presidente da CNA, o ministro belga ouviu também dos ministros do Desenvolvimento, Armando Monteiro, e da Agricultura, Kátia Abreu, a repetição do interesse brasileiro no acordo comercial com a UE e a cobrança de que se marque nova data para a troca de ofertas. De Crem admitiu que há um impasse, que só será superado com negociações “em alto nível”, mas observou: “A UE quer saber de onde partiremos para abrir essas negociações”.

As negociações do acordo de livre-comércio entre o Mercosul e o Brasil começaram em 1999, mas, por falta de propostas concretas – um lado responsabiliza o outro pelos atrasos –, pouco avançaram. Os ministros brasileiros que se encontraram com o belga apenas repetiram o que, há tempos, autoridades, incluindo a presidente Dilma Rousseff, vêm dizendo sobre o interesse do Brasil em concluir as negociações.

Mas quase nada foi além da retórica. Há um ano não se registra avanço sensível nas discussões, sobretudo porque o Mercosul ainda não conseguiu concluir uma proposta que possa pelo menos propiciar o início de uma discussão mais profunda. Foram descumpridos os prazos para a apresentação das propostas e não foram fixados novos, mas nenhuma das partes admite que os entendimentos estão paralisados.

A UE já decidiu que, para iniciar as discussões, a lista do Mercosul dos produtos que terão a tarifa de importação liberada deve representar pelo menos 90% do comércio entre as duas regiões. O prazo para essa liberação deve ser de 10 anos.

Autoridades brasileiras garantiram, em diversas oportunidades, que a proposta do Mercosul está “quase pronta”. Mas o entendimento dentro do bloco sobre a proposta mínima está longe de ser alcançado. Quanto ao prazo para a liberação das tarifas, Brasil, Uruguai e Paraguai já concordaram com 12 anos, mas a Argentina tem insistido em 15 anos, com 7 de carência para a transição.

Além disso, o governo argentino se recusa a incluir na lista de produtos a terem as tarifas de importação liberadas vários que considera “sensíveis” e que têm grande peso no comércio com a UE, o que reduz a proposta de liberação comercial. A despeito de alguns avanços alcançados no ano passado, inclusive na oferta brasileira, a média da proposta do Mercosul continua abaixo dos 90% citados pelos europeus.

A conclusão dos entendimentos entre a UE e os Estados Unidos para um amplo acordo sobre comércio e investimentos iniciados há dois anos tenderá a reduzir o espaço nos dois maiores mercados do mundo para países que não tenham fechado acordos semelhantes com cada uma das duas partes. O Mercosul não tem acordo com nenhuma delas, daí a urgência da conclusão dos entendimentos com a UE.

O atraso é particularmente ruim para o Brasil, que precisa conquistar mercados. Preso às regras do Mercosul – que impedem acordos comerciais isolados –, o Brasil, ao contrário do que fizeram outros países latino-americanos, não teve facilitado o acesso ao seu principal mercado, o americano. Corre o risco de perder também vantagens no mercado europeu.

E o que já avançava pouco pode ficar ainda mais lento. Com a renovação da cúpula da União Europeia no ano passado, saíram de cena dois dos principais interessados no acordo do bloco com o Brasil – o português José Manuel Durão Barroso, que presidia a Comissão Europeia, e o holandês Herman van Rompuy, que presidia o Conselho Europeu.

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