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Nova ofensiva contra o CNJ

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Por Redação
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Nos dois anos em que esteve à frente da Corregedoria Nacional de Justiça, a ministra Eliana Calmon acusou as Justiças estaduais – responsáveis por mais da metade dos gastos do Judiciário – de sabotar o Conselho Nacional de Justiça (CNJ). Também apontou a maior Corte do País – o Tribunal de Justiça de São Paulo (TJSP) – como o principal foco de resistência das corporações judiciais às iniciativas do CNJ para pôr fim ao nepotismo da magistratura e cobrar eficiência das corregedorias na apuração de casos de corrupção envolvendo juízes.

Desde então, os fatos demonstram que a ministra estava com a razão. A última ofensiva contra o CNJ partiu do TJSP, depois que seu novo presidente, desembargador Paulo Dimas Mascaretti, defendeu uma reivindicação do Colégio Permanente de Presidentes de Tribunais de Justiça. Sob a justificativa de que as Justiças Federal e Trabalhista têm seus conselhos, os TJs querem criar um Conselho da Justiça Estadual – medida que depende da aprovação de emenda constitucional.

A reivindicação ganhou força em 2015, depois que o presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), Ricardo Lewandowski, instituiu dois conselhos consultivos na cúpula do CNJ. Um deles é formado por associações de magistrados. O outro é integrado pelos membros do Colégio Permanente de Presidentes de Tribunal de Justiça – entidade que não pertence à estrutura formal do Judiciário e que costuma reunir-se em hotéis e resorts pagos, muitas vezes, com dinheiro privado. As associações de magistrados e o colégio de desembargadores sempre se opuseram à ação fiscalizadora do CNJ.

Ao justificar a criação desses dois conselhos, Lewandowski alegou que, apesar de a Justiça estadual ser o maior ramo do Judiciário, ela não conta com um conselho próprio, o que a enfraqueceria politicamente. Egresso do TJSP, o ministro – que tem relegado a Corregedoria Nacional de Justiça para segundo plano na elaboração das pautas do CNJ – é um dos defensores da conversão dos conselhos consultivos em conselhos deliberativos.

Por serem entidades privadas de caráter sindical, e não órgãos institucionais, as associações de magistrados não poderiam ter representação formal no CNJ. Trata-se de uma aberração jurídica – além de suscitar discussões éticas, uma vez que elas agem como grupo de pressão na defesa dos interesses corporativos da magistratura. Já no caso do Conselho da Justiça Estadual, a proposta colide com a Emenda Constitucional (EC) 45, que criou o CNJ como um órgão nacional encarregado de coordenar a modernização dos 90 tribunais do País. Antes da EC 45, os TJs eram marcados por gestões pouco transparentes, comportando-se como verdadeiras ilhas soberanas.

Invocando o princípio da separação dos Poderes, os presidentes dessas cortes não se limitavam a encaminhar suas previsões de gastos aos governos estaduais e aguardar o envio do dinheiro. Acostumaram-se a encaminhar pedidos de suplementação de verbas, esquecendo-se de que o cofre é um só e a responsabilidade sobre o que sai e entra – principalmente do que sai – é do Executivo.

Um dos objetivos da criação do CNJ foi racionalizar as despesas de custeio e acabar com os gastos perdulários de todos os braços do Judiciário. O que os desembargadores almejam, quando defendem a criação de um Conselho da Justiça Estadual, é recuperar a autonomia plena dos Tribunais de Justiça, esvaziando o CNJ. E quando invocam a existência dos Conselhos das Justiças Federal e Trabalhista como justificativa, deixam de lado o fato de que, promulgada a EC 45, as atribuições desses órgãos foram absorvidas pelo CNJ.

Desde sua implantação, em 2005, o CNJ enfrenta o desafio de promover o controle da atividade jurisdicional e uma gestão administrativa centralizada do Poder Judiciário, porém harmônica com a estrutura federativa do País. Após dez anos de funcionamento, o saldo é bastante positivo – e é isso que explica o surgimento de novos surtos de resistência corporativa da magistratura, inclusive com apoio do presidente do STF, o que é, antes de mais nada, insensato.