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O BC quase otimista

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Por Redação
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A pior fase da crise foi superada, a reação começou e a produção brasileira deve crescer neste ano 0,8%, segundo a nova projeção do Banco Central (BC), contida no Relatório de Inflação, uma ampla análise trimestral da economia nacional e do cenário externo. A estimativa é mais animadora que a dos especialistas do setor privado. A Confederação Nacional da Indústria (CNI) prevê uma contração de 0,4%. No setor financeiro, a bola de cristal dos economistas indicava, no começo da semana, um PIB 0,57% menor que o de 2008. Seria um exagero, no entanto, qualificar como otimista a avaliação dos técnicos do BC. A recuperação, segundo eles, dependerá principalmente do consumo e o resultado poderá ser inferior ao previsto, se as condições de emprego piorarem e os incentivos fiscais forem revertidos. Além disso, o investimento privado continua baixo e deve recuperar-se lentamente, porque ainda há muita capacidade ociosa nas empresas. Quanto às exportações, continuarão afetadas pela retração da economia internacional e não se pode esperar do setor externo nenhuma contribuição ao crescimento da atividade industrial. A cautela em relação a esses pontos é inteiramente justificável. Pelos últimos dados de emprego, divulgados pouco antes do novo Relatório de Inflação, o número de pessoas ocupadas permanece estagnado e a renda média dos trabalhadores diminuiu ligeiramente em maio. Além disso, o pior cenário é o da indústria de transformação, a maior fonte de empregos de qualidade. Se nada piorar e a previsão de 0,8% de expansão econômica for confirmada, a economia brasileira ainda terá pela frente uma boa fase de convalescença, porque o investimento produtivo terá sido muito baixo neste ano e o comércio exterior terá encolhido consideravelmente. Pelas projeções do BC, o investimento em máquinas, equipamentos e instalações deve diminuir 5,1%, a receita de exportações de bens deve diminuir 20,2%, em dólares, e o gasto com importações deve cair 20,3%. Como a despesa cairá mais que a receita, no comércio exterior, o superávit comercial ainda poderá ficar em US$ 20 bilhões, US$ 3 bilhões acima do valor projetado no relatório anterior. O déficit projetado para as transações correntes do balanço de pagamentos foi reduzido de US$ 16 bilhões para US$ 15 bilhões. A evolução das contas externas está sendo, afinal, melhor do que se previa quando a crise começou. Isso se explica, em parte, pela relativa robustez das exportações de produtos primários. O relatório do BC acentua algumas novidades importantes e muito positivas na crise atual. "Em contraste com choques anteriores, mesmo de menor intensidade, não houve ruptura do balanço de pagamentos, crise financeira do setor público, alta da inflação ou desconfiança de mudança de regime." A economia brasileira, como se esperava, está mais resistente a choques externos e tem potencial para enfrentá-los sem maior desarranjo nos preços, nas condições fiscais e na solvência externa. Nessas condições, o BC pode afrouxar a política monetária, como tem afrouxado, para facilitar a recuperação das atividades. Noutras crises, a reação normal era elevar os juros e apertar o crédito, para conter a saída de capitais e combater o impacto inflacionário da alta do dólar. Sobra, segundo o relatório, um espaço residual para redução dos juros, porque as projeções de inflação - tanto as do BC quanto as do mercado - apontam para uma evolução moderada dos preços neste e no próximo ano. Mas a autoridade monetária, segundo o documento, continuará empenhada em seu papel principal - conduzir a inflação para a meta. Embora as projeções sejam de modo geral tranquilizadoras, o documento aponta alguns fatores de insegurança, como o reajuste de tarifas de serviços públicos e outros preços indexados. Além do mais, os cortes de juros levarão bom tempo, ainda, para afetar plenamente os preços. Os autores do relatório tratam com muito boas maneiras a condução da política fiscal, evitando choques com outras áreas do governo. Mas não deixam de apontar o contraste entre receita tributária em queda e a rigidez do gasto público. Esse contraste, embora o documento não mencione o detalhe, se manifestou claramente, em maio, no déficit do governo central.