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O bom recado do BC

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Por Redação
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A inflação elevada e resistente preocupa o Banco Central (BC), justifica o novo aumento de juros e será vigiada com especial atenção nos próximos meses. Esta é a mensagem mais positiva incluída na ata da última reunião do Comitê de Política Monetária (Copom), divulgada ontem. Desta vez, o aumento da taxa básica, de 0,5 ponto porcentual, foi o dobro do fixado na reunião anterior, em 17 de abril. Transparece no texto, claramente, o esforço de recuperação da imagem do BC como um guardião capaz de tomar medidas severas em busca da estabilidade de preços. Credibilidade é essencial para o trabalho de coordenação das expectativas, uma das funções principais das autoridades monetárias em todo o mundo. No Brasil, esse atributo vinha sendo perigosamente erodido, até há pouco, por manifestações desastradas da presidente Dilma Rousseff e pela aparente perda de autonomia operacional - para dizer o mínimo - da instituição. O cenário apresentado na ata é bem menos rosado que aquele geralmente descrito pelas autoridades federais. Não contém grande novidade para quem acompanha o noticiário econômico, mas impressiona principalmente pela avaliação severa dos dados.Segundo a ata, a demanda interna tende a continuar robusta, especialmente no caso do consumo das famílias. Essa tendência deve ser sustentada "em grande parte" por vários fatores de estímulo, como o crescimento da renda e "a expansão moderada do crédito". Esse ambiente, acrescentam os autores do relatório, "tende a prevalecer neste e nos próximos semestres". O uso do plural merece atenção: "próximos semestres". Essa afirmação contrasta, certamente, com uma afirmação feita pelo ministro da Fazenda, Guido Mantega, na quarta-feira. Segundo ele, a inflação, já em declínio, logo estará "fora da pauta". Alguns indicadores de inflação têm declinado. Outros caíram e voltaram a subir, porque a desinflação dos alimentos ou terminou ou se tornou menos intensa e, além disso, porque fatores mais importantes continuam presentes. Entre esses fatores, destacados na Ata do Copom, incluem-se a demanda de consumo das famílias, ainda forte, as expectativas dos agentes e "a estreita margem de ociosidade no mercado de trabalho" e a indexação de contratos.Enquanto a oferta de mão de obra continuar escassa, haverá o risco de "concessão de aumentos de salários incompatíveis com o crescimento da produtividade". Já há sinais de moderação nesses aumentos, mas, segundo o comitê, a evolução dos salários continua gerando pressões inflacionárias de custos. Os sinais de moderação foram confirmados, há poucos dias, pelo Departamento Intersindical de Estatísticas e Estudos Socioeconômicos (Dieese). Nas negociações salariais deste ano os aumentos reais foram menores e menos frequentes que nas do ano passado. Mas o alto nível de emprego, favorecido pelo custo das demissões e pela escassez de trabalhadores qualificados, continua influenciando os acordos. As consequências aparecem tanto nos custos de produção quanto na demanda de consumo, embora os consumidores estejam mais cautelosos que em 2012. Segundo a ata, os membros do Copom continuaram considerando, na avaliação geral do cenário, a hipótese de cumprimento das metas fiscais em 2013 e 2014. Tem sido esse o procedimento habitual. Mas a hipótese é obviamente irrealista e esse detalhe destacado muito diplomaticamente no texto: "O cenário central para a inflação leva em conta a materialização das trajetórias com as quais trabalha para as variáveis fiscais, não obstante iniciativas recentes apontarem o balanço do setor público em posição expansionista". Traduzindo: a baderna fiscal continua e o Copom sabe disso, apesar do ato de fé no cumprimento da meta. No fim do parágrafo, uma advertência: alcançar o superávit primário prometido contribuirá para diminuir o desajuste entre demanda e oferta, ajudará a derrubar a relação dívida pública/PIB e elevará a confiança nas condições da economia. Em linguagem mais direta: o governo também tem de fazer a sua parte.