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O Brasil e o FMI

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Por Redação
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O Brasil aplicará, nos próximos dias, US$ 10 bilhões em títulos do Fundo Monetário Internacional (FMI), tornando-se credor da instituição, anunciou o ministro da Fazenda, Guido Mantega. A decisão é possibilitada pela solidez das contas externas e atende à conveniência de diversificar as reservas cambiais, que atingiram US$ 204,6 bilhões em 9 de junho. O diretor-gerente do FMI, Dominique Strauss-Kahn, enfatizou que "o Brasil mais uma vez reafirma seu forte papel de liderança entre as economias emergentes". Com o anúncio, o País cumpre compromisso assumido na reunião de cúpula do G-20, em Londres, em abril. O FMI deverá receber aportes de US$ 750 bilhões para enfrentar a crise e financiar a retomada, sobretudo do comércio global. Do montante total, US$ 500 bilhões deverão ser aportados pelos países-membros do G-20. No grupo dos Brics, a China comprometeu-se a aplicar US$ 50 bilhões e a Rússia, US$ 10 bilhões, mas a Índia ainda não anunciou o montante. Os Estados Unidos se comprometeram a destinar US$ 108 bilhões ao FMI, mas o Congresso ainda não aprovou a aplicação dos recursos. A decisão de investir em títulos do FMI é plenamente justificada por razões econômicas que transcendem o desejo do País de " ajudar a comunidade internacional", a que se referiram as autoridades locais. Ao subscrever títulos do FMI, o Brasil poderá pressionar por reformas na instituição, como ressaltaram o ministro da Fazenda e o diretor-gerente do Fundo. As autoridades brasileiras mostraram "seu engajamento no processo total de reforma e expansão dos recursos do FMI", declarou Strauss-Kahn, segundo o noticiário divulgado no site da organização. Ficará para mais tarde, se for conveniente, a subscrição de novas cotas do Fundo pelo Brasil, o que permitiria aumentar de fato o peso do País nas decisões do FMI. Os títulos do FMI a serem subscritos pelos países-membros farão parte das reservas cambiais das nações. Eles serão expressos na moeda do FMI, os Direitos Especiais de Saque (DES). O DES é uma moeda escritural cujo valor oscila conforme as cotações de uma cesta de quatro moedas - o dólar (que entra na proporção de 44% para a formação do valor do DES), o euro (34%), a libra (11%) e o iene (11%). Isto significa que o Brasil reduzirá sua exposição ao dólar, moeda que tem apresentado grande flutuação. Depois de se valorizar 17% entre agosto de 2008 e o início de março deste ano, entrou em queda com a deterioração das condições fiscais nos Estados Unidos. É um problema global, que o Brasil não pode ignorar. Ante o vulto das aplicações globais em dólares e a acumulação de superávits, sobretudo pela China, o analista Martin Wolf, do Financial Times, afirmou em sua coluna de terça-feira: "Se a China e outros países superavitários desejarem acumular superávits enormes e um vasto estoque de ativos financeiros, devem esperar calotes." Em situação cambial favorável, o Brasil não apenas aumentou suas reservas quase seis vezes desde 2009 (tinha, então, reservas de US$ 35,9 bilhões), como ampliou seu acesso ao mercado internacional, apesar da crise. Entre dezembro de 2008 e 9 de junho, o risco Brasil, que indica o grau de confiança nos papéis do País, caiu de 428 pontos básicos acima dos títulos norte-americanos para 261 pontos. Há um mês, estava em 394 pontos. Isto significa que o juro que o País paga no mercado internacional caiu 1,7 ponto porcentual ao ano, desde dezembro. A subscrição de títulos do Fundo tem tudo a ver com a melhora da situação cambial brasileira - em maio, o fluxo de recursos externos foi positivo em US$ 1,583 bilhão, em contraste com os US$ 3,487 bilhões negativos, em abril. O real fortaleceu-se e há expectativa de ingresso de um grande fluxo de capitais estrangeiros, sobretudo para investimentos diretos. Mais do que uma situação momentânea, o Brasil beneficia-se da política de câmbio flutuante e das expectativas favoráveis de longo prazo, graças às reservas do pré-sal. O investimento em títulos do FMI é uma demonstração de vitalidade cambial, inédita na história brasileira.