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O concurso nacional de docentes

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Por Redação
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Um ano depois de ter proposto a unificação dos concursos para a seleção dos professores da rede pública de ensino infantil, fundamental e médio dos Estados e municípios, comprometendo-se a preparar as provas e criar um padrão nacional de escolha de docentes, o Ministério da Educação (MEC) retomou o tema, anunciando a criação de um Exame Nacional de Ingresso na Carreira Docente. Pelo que foi divulgado, docentes de qualquer parte do País poderão se candidatar à seleção para trabalhar em escolas públicas. Para ser implementada, a inovação depende da adesão dos governadores e prefeitos e, até o momento, não ficou decidido se a seleção unificada será realizada com base num teste único ou se, na lista de classificação, deverão ser considerados outros fatores, como o currículo dos candidatos, títulos acadêmicos e conhecimento das especificidades sociais e econômicas dos Estados e municípios onde pretendem atuar. Apesar disso, o MEC está com pressa e quer realizar o exame já em 2011. Os conteúdos que deverão ser exigidos no processo seletivo serão submetidos a consulta pública durante 45 dias, a partir da próxima semana. Após esse prazo, o MEC elaborará a matriz que servirá de base para a formulação das questões. Essa é mais uma amostra do irrealismo das autoridades educacionais federais. Tendo tido quase oito anos para tomar uma iniciativa desse porte, elas só resolveram agir a sete meses do término do mandato do presidente Lula, deixando para seu sucessor a responsabilidade pela implementação de uma medida que quase certamente sofrerá a oposição de governadores e prefeitos.O ministro Fernando Haddad alega que os concursos para professores da rede escolar dos Estados e municípios são de baixa qualidade e afirma que a centralização do processo seletivo seria um "instrumento adicional" para qualificar o magistério público. Contudo, que autoridade tem o MEC para assumir o controle dessa seleção, uma vez que não conseguiu implementar com sucesso o processo de unificação dos vestibulares das universidades federais nem manter a eficiência dos mecanismos de avaliação, que foram desmoralizados após o vazamento das provas do último Exame Nacional do Ensino Médio? Na realidade, a proposta do MEC retira dos Estados e municípios a autonomia que lhes foi concedida pela Constituição, em matéria de ensino básico. O que hoje é de responsabilidade das autoridades municipais e estaduais ficaria sob controle dos burocratas de Brasília. Além do excesso de intervenção federal, a proposta vai na contramão do que os especialistas recomendam: a descentralização da gestão escolar, que permite adequar escolas e corpos docentes às condições sociais de cada região. Para muitos pedagogos, o excesso de concentração de prerrogativas no âmbito do MEC, que já centraliza o ensino superior, despreza as diferenças regionais do País, que são profundas, desequilibrando com isso todo o sistema educacional. Os especialistas lembram que a "federalização do ensino" permitiria ao MEC ficar com a parte que oferece maior visibilidade política, enquanto às autoridades municipais e estaduais restaria o ônus da administração do dia a dia das salas de aula. Dito de outro modo, enquanto o MEC teria poucas responsabilidades executivas, os Estados e municípios teriam de arcar com o trabalho mais pesado e maior potencial de desgaste político. Isso ficou evidente há dois anos, por ocasião da imposição do piso salarial para os professores do magistério público. A iniciativa levou o presidente Lula e o ministro Fernando Haddad às manchetes dos jornais. Parte da conta, porém, foi destinada aos Estados e municípios - muitos dos quais não dispunham de condições financeiras para pagá-la.Mais uma vez o governo federal está agindo demagogicamente no campo do ensino, lançando uma inovação em tempo de ser usada politicamente na campanha eleitoral, mas que pode dificultar ainda mais a melhoria da qualidade da educação básica que terá de ser prioridade do próximo governo.