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O custo da crise financeira

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Por Redação
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O setor financeiro ainda vai contabilizar trilhões de dólares de prejuízos, sua recuperação será lenta e custosa e o crédito continuará difícil para as economias emergentes enquanto a insegurança dos bancos não for superada. Este é o cenário traçado no Relatório de Estabilidade Financeira Global divulgado na terça-feira pelo FMI. Os países emergentes precisam de cerca de US$ 1,8 trilhão de refinanciamentos neste ano, mas o fluxo de capitais para esses países deve ser negativo, segundo as últimas projeções. Nesse quadro, a situação dos latino-americanos, incluído o Brasil, é mais confortável do que nas crises de outras décadas e bem mais favorável que a dos países do Leste Europeu, com sistemas bancários em graves dificuldades e contas externas no vermelho. O Brasil precisará, em 2009, refinanciar débitos externos equivalentes a 40% de seu estoque de reservas internacionais, neste momento próximas de US$ 200 bilhões. Para a maior parte dos países da Europa Oriental essa necessidade ultrapassa o total de reservas. No caso da Lituânia, o estoque de moeda estrangeira não daria para pagar um quarto dos compromissos com vencimento neste ano. O quadro de indicadores incluído no relatório global de finanças do FMI é mais um excelente argumento a favor da política de acumulação de reservas adotada nos últimos anos pelo Banco Central (BC) do Brasil. Essa política foi muito cara, segundo os críticos, porque o rendimento obtido com a aplicação dos dólares foi muito baixo. Um volume bem menor de reservas teria sido suficiente, de acordo com esses analistas. A extensão e a gravidade da crise contrariam essa avaliação. A instabilidade nos países mais avançados atingiu o Brasil pela redução dos financiamentos e pela contração do comércio. Com reservas em torno de US$ 200 bilhões, o BC foi capaz de suprir parte do financiamento externo perdido com a crise e, além disso, a relativa solidez do balanço de pagamentos desencorajou, até agora, ataques especulativos ao real. Ataques desse tipo, quando prolongados, normalmente resultam em ampla depreciação cambial e graves surtos de inflação. Nenhum dos dois fenômenos ocorreu desta vez, nem ocorrerá, provavelmente, se nenhuma imprudência muito grande for cometida nos próximos meses pelas autoridades. Por enquanto, as ações mais arriscadas estão ocorrendo na área da política fiscal. Sem nenhum planejamento, o governo tem multiplicado as bondades fiscais de acordo com as pressões de setores influentes e com as conveniências eleitorais. O mercado parece ter recebido essas medidas com relativa tranquilidade, até agora, mas o governo, por segurança, deveria refrear o seu voluntarismo. Ninguém sabe quanto tempo a crise ainda vai durar nem estimou o custo financeiro da recuperação. Quando a economia voltar a crescer nos Estados Unidos e na Europa Ocidental, os governos terão de enfrentar a dívida acumulada na recessão e isso provavelmente vai encarecer o crédito internacional. O Brasil precisará estar preparado também para atravessar essa fase sem maiores danos. De imediato, o desafio, para o País, é enfrentar a crise sem afundar na recessão e sem comprometer os fundamentos econômicos, isto é, sem deixar que se deteriorem as contas públicas e o balanço de pagamentos. O Brasil poderá contribuir parcialmente para o combate à crise, oferecendo recursos ao FMI para financiar os sócios em dificuldades. Mas pouco ou nada poderá fazer diretamente para a solução do problema central - a insegurança do setor financeiro. A curto prazo, a tarefa de sanear o sistema, absorvendo os créditos podres e capitalizando os bancos viáveis, caberá aos governos dos EUA e de outros países avançados. As perdas acumuladas pelo sistema desde o início da crise poderão chegar a US$ 4 trilhões até 2009, segundo a nova estimativa do FMI. Para as operações bancárias voltarem ao nível anterior à crise, serão necessárias injeções de capital de US$ 875 bilhões. Esse seria o montante necessário para recapitalizar os bancos enfraquecidos pela crise, mas passíveis de recuperação depois da "esterilização" dos créditos tóxicos. Se a meta for atingir o padrão observado em meados dos anos 90, o total necessário poderá chegar a US$ 1,7 trilhão. Desse esforço, pelo menos, o Brasil estará livre.